Texto apresentado como atividade complementar, da disciplina Direito Civil IV, do curso Direito bacharelado - noturno -, semestre 2019.1, da UFRN
Os direitos de personalidade são entendidos pela doutrina e pela jurisprudência, em regra, como irrenunciáveis e intransmissíveis. Tais direitos consubstanciam-se na faculdade que toda pessoa tem de comandar o uso da própria aparência, corpo, imagem, nome ou qualquer outra característica atinente à sua identidade.
Tradicionalmente,
entende-se a personalidade como aptidão para adquirir direitos e contrair
obrigações, ligada à ideia de ser sujeito de direitos. Conforme o Código Civil,
art. 1º: “Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil”.
O
começo da personalidade civil começa com o nascimento com vida, mas a lei
protege, desde a concepção, os direitos do nascituro (CC, art. 2º). Logo, basta
nascer e respirar pela primeira vez para se tornar uma pessoa humana,
suscetível de adquirir direitos e contrair obrigações.
Em
que pese serem vistos como direitos atinentes à promoção da pessoa na defesa de
sua essencialidade e dignidade, o reconhecimento dos direitos de personalidade
– como categoria de direito subjetivo – é relativamente recente.
Foram
criados após 1948, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos e, segundo o
filósofo canadense Charles Taylor (1931 -), pressupõem três condições essenciais:
autonomia da vontade, alteridade e dignidade.
Já
a Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, X, nos lembra que: “são
invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de
sua violação”.
Ora,
tais institutos relacionados com os direitos de personalidade – alteridade,
autonomia da vontade, dignidade, irrenunciabilidade, intransmissibilidade,
inviolabilidade –, são desrespeitados, relativizados e escamoteados quando se
trata dos “reality shows”.
Os
reality shows são um gênero de
programa de televisão baseados na vida real. Dotado de diversos formatos
apresentam, literalmente, todos os aspectos da vida dos participantes, de
maneira invasiva, sem “cortes” e com forte apelo sensacionalista.
Os
reality shows começaram na TV aberta
brasileira a partir dos anos 2000. De lá para cá se popularizaram na cultura de
massa e foram explorados por quase todas as emissoras de televisão.
Os
mais famosos, não por qualidade ou bom gosto, mas pelas polêmicas que geraram,
foram: No Limite (Rede Globo), Big
Brother Brasil (Rede Globo), A Fazenda (Record TV), Casa dos Artistas
(SBT), Supernanny (SBT), O Aprendiz
(Band) e Mulheres Ricas (SBT).
Nestes
programas é comum os participantes assinarem um contrato onde abrem mão do seu
direito de imagem, da intimidade, da autonomia de vontade, da honra, da vida
privada, da dignidade.
Nos
reality shows vemos pessoas comuns
que, em nome da fama (mesmo que passageira) acabam dispondo de algo
irrenunciável: sua vida íntima. E os produtores de tais programas sabem do
poder que detém nas mãos quando se trata dos ‘competidores’ desses programas. A
‘direção da casa’ tem, literalmente, carta branca para fazer o que quiser,
quando quiser, com quem quiser.
Cenas
de sexo explícito, fofocas, brigas, tudo ao vivo!!! Um verdadeiro show de
horrores, capaz de causar nas mentes mais cultas ânsia de vômito. Mas ao
contrário do bom senso, o grande público parece não se importar muito com isso.
Parece
um ciclo vicioso. Quanto mais os participantes têm suas vidas privadas
devassadas, sua intimidade invadida e sua dignidade como pessoa humana jogada
na lata do lixo, mais os telespectadores gostam, a audiência aumenta, e mais a
direção do programa explora a imagem dos participantes.
A
intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, apesar de
constitucionalmente tutelados, não parecem receber o devido valor e o devido
respeito nos reality shows apresentados
na TV brasileira.
Em nome do lucro e da
fama fugaz o direito de personalidade, direito fundamental tão imprescindível
para a dignidade da pessoa humana, conquistado ao longo da história através de
duras lutas sociais, tem sido relegado a segundo plano. E o mais impressionante
é que ninguém parece se importar com isso. Lamentável...
Bibliografia:
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da
República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal:
Centro Gráfico, 1988, 292 p;
BRASIL. Código
Civil, Lei 10.406, de 10 de janeiro de
2002. Brasília, DF: Senado Federal:
Centro Gráfico;
Personalidade
e Capacidade no Direito Civil, disponível em: https://sergiocardosojr.jusbrasil.com.br/artigos/170930718/personalidade-e-capacidade-no-direito-civil;
(A imagem acima foi copiada do link Oficina de Ideias 54.)
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