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segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

RELAÇÕES DE TRABALHO AO LONGO DA HISTÓRIA (III)


As modernas organizações corporativas da atualidade, mesmo tendo a seu alcance a tecnologia mais avançada que a humanidade já conheceu, ainda baseiam seu modelo de administração e de gestão numa estrutura hierarquizada que remonta aos primórdios do capitalismo industrial. 

Apesar das conquistas trabalhistas, fruto das lutas operárias históricas, tal modelo de gestão não é o ideal, pois se mostra opressor e hostil, gerando uma verdadeira atmosfera de terror dentro das corporações, haja vista trazer em seu bojo a exploração do homem pelo homem.

E, por mais paradoxal que possa parecer, as relações laborais de hoje em muito se assemelham àquelas dos primórdios do trabalho assalariado: ambiente de trabalho insalubre e perigoso, que coloca em risco a saúde e a integridade física e mental do obreiro; jornadas de trabalho extenuantes; falta de estabilidade no emprego; pressão por metas, quase sempre abusivas; assédio moral

Somado a isso tudo, temos ainda a chamada flexibilização e a desregulamentação trabalhistas, que fragilizam as relações laborais, em detrimento do trabalhador. Segundo Maurício Godinho Delgado:

Por flexibilização trabalhista entende-se a possibilidade jurídica, estipulada por norma estatal ou por norma coletiva negociada, de atenuação da força imperativa das normas componentes do Direito do Trabalho, de modo a mitigar a amplitude de seus comandos e/ou os parâmetros próprios para a sua incidência. Ou seja, trata-se da diminuição da imperatividade das normas justrabalhistas ou da amplitude de seus efeitos, em conformidade com autorização fixada por norma heterônoma estatal ou por norma coletiva negociada. Pela flexibilização, o preceito legal trabalhista é atenuado em seus comandos e efeitos abstratamente estabelecidos (...) A desregulamentação trabalhista consiste na retirada, por lei, do manto normativo trabalhista clássico sobre determinada relação socioeconômica ou segmento das relações de trabalho, de maneira a permitir o império de outro tipo de regência normativa. (...) Nessa medida, a ideia de desregulamentação é mais extremada do que a ideia de flexibilização, pretendendo afastar a incidência do Direito do Trabalho sobre certas relações socioeconômicas de prestação de labor. (DELGADO, 2019.)

Tanto a flexibilização, quanto a desregulamentação trabalhista tolhem cada vez mais os já combalidos direitos dos trabalhadores. Apesar de apresentadas para a sociedade como uma saída para o desemprego, tais institutos são mais nocivos do que benéficos aos obreiros. “Embora se fale, eufemisticamente, em simplificação, desburocratização, racionalização e modernização (...) o fato é: as inovações, em sua vasta maioria, debilitam, direta ou indiretamente, os direitos e garantias trabalhistas” (DELGADO, 2019, p. 122).  

Como não poderia deixar de ser, o ataque aos direitos, conquistados por lutas ao longo da história, gera nos empregados o medo da demissão. Somado a isso, a globalização econômica predatória e sua busca incansável por lucro, bem como o atual modelo de gestão na organização do trabalho, marcada pela competição agressiva e pela opressão dos trabalhadores, criam no ambiente laboral um clima de ansiedade, angústia, medo, e tensão constantes.

O novo paradigma é o “sujeito produtivo”, ou seja, o trabalhador que ultrapassa metas, deixando de lado a sua dor ou a de terceiro. É a valorização do individualismo em detrimento do grupo de trabalho. A valorização do trabalho em equipe assume um valor secundário, já que a premiação pelo desempenho é só para alguns trabalhadores, ou seja, os que atingem as metas estabelecidas, esquecendo-se que o grupo também é o responsável pelos resultados da empresa.  O individualismo exacerbado reduz as relações afetivas e sociais no local de trabalho, gerando uma série de atritos, não só entre as chefias e os subordinados, como também entre os próprios subordinados. (CAVALCANTE; NETO, 2005.)

Neste cenário de terror são gestadas algumas das causas responsáveis pelo assédio moral, uma espécie de violência contra o trabalhador cada vez mais corriqueira no mundo do trabalho moderno, porém, ainda ignorada ou até mesmo tratada como tabu no seio das corporações. Por ser o setor bancário um ambiente de extrema rotatividade no emprego e alvo de constantes avanços tecnológicos, que por sua vez causa a informatização do atendimento e tolhe os postos de trabalho, o assédio moral é um traço marcante deste nicho laboral.

Fonte: CAVALCANTE, Jouberto de Quadros Pessoa; NETO, Francisco Ferreira Jorge: O Direito do Trabalho e o assédio moral

DELGADO, Maurício Godinho: Curso de Direito do Trabalho: obra revista e atualizada conforme a lei da reforma trabalhista e inovações normativas e jurisprudências posteriores - 18. ed., São Paulo: LTr, 2019. Livro em PDF.  

(A imagem acima foi copiada do link Biffi Advocacia Resolutiva.) 

segunda-feira, 24 de maio de 2021

ASSÉDIO MORAL NA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (II)

Jurisprudência para servir como pesquisa àqueles com interesse na área. Apresenta práticas abusivas e covardes no ambiente de trabalho, perpetradas rotineiramente pela Caixa Econômica Federal contra seus empregados.


ABUSO DO PODER DIRETIVO E EXCESSO DE METAS

Quando o juízo de origem julga improcedente o pedido de indenização por assédio moral, a parte autora pode - e deve - recorrer da decisão. No caso ora analisado, temos uma situação assim. 

A narrativa da Autora, quanto à prática de assédio moral na Caixa Econômica, é corroborada pelo relato de testemunhas. Assédio este, diga-se de passagem, é uma prática infame, covarde e vil, não se confundindo com o chamado poder diretivo do empregador.

"A Autora insurge-se contra esta decisão, aduzindo que: os depoimentos das testemunhas confirmaram a venda de produtos do Réu, tarefa alheia às suas atribuições; a fixação de metas pode ser admitida para vendedores, não para outros empregados que exercem outras funções; a obrigação de vender produtos e atingir metas a deixava tensa, comprometendo seu desempenho nas tarefas de caixa.

Com razão.

A prova testemunhal confirma a narrativa trazida pela Autora na inicial, quanto ao assédio moral sofrido. Transcreve-se:    

... que todos que trabalham em agência são obrigados a vender produtos, sob pena de perderem a função, de serem transferidos... (testemunha da Autora, fl. 466).

... que existem metas para venda de produtos e, em regra, quem não vende produtos suficientemente sofre eventualmente ameaças de transferência de agência; (...) (testemunha do Réu, fl. 467).

Inicialmente, ressalte-se que a Autora sequer tinha dentre suas atribuições vender produtos, uma vez que era caixa. Desse modo, a cobrança de metas se dava no exercício de função para a qual a Autora não tinha sido contratada.

Ademais, mesmo que se considere, conforme aduzido na defesa, que o oferecimento de produtos faz parte da rotina do trabalho desenvolvido nas agências, ainda assim o comportamento da Ré não encontraria escusa na alegação de uma simples cobrança de metas.  

Embora o empregador detenha o poder diretivo, podendo exigir resultados da força de trabalho contratada, não pode se eximir de agir com equilíbrio e respeito.

As cobranças de resultados devem observar os limites de razoabilidade, não se admitindo que para alcançá-las o empregado deva sofrer violação à sua honra e dignidade.

A transferência de agência é o tipo de ameaça que desequilibra o trabalhador, pois tal modificação pode provocar caos em sua vida, via de regra, organizada em torno do local de trabalho. Desse modo, esta ameaça não encontra escusa no poder diretivo do empregador.

Sem dúvida que situações como as mencionadas, trazem insegurança e constrangimento à trabalhadora, e demonstram desrespeito e descaso com sua integridade psíquica. 

O assédio moral é inequívoco, bem como o nexo de causalidade entre o dano sofrido e o ato praticado pelo Réu. 

Arbitra-se o valor da indenização em R$ 30.000,00, a fim de adequar ao dano sofrido e à longa duração do contrato, além do porte financeiro do Réu. Assim, tal valor lhe servirá como medida pedagógica para impedir este tipo de procedimento em suas dependências. 

Assim, concede-se provimento ao recurso da Autora para julgar procedente o pedido de indenização por assédio moral, no valor de R$ 30.000,00".

No caso em tela, o TRT/1 julgou procedente o pedido da Autora e, por unanimidade, os Desembargadores condenaram a Caixa Econômica Federal ao pagamento de indenização por assédio moral, no importe de R$ 30.000,00:

DISPOSITIVO

"ACORDAM os Desembargadores da 7ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, por unanimidade, não conhecer o recurso do Réu, por falta de dialeticidade, e conhecer o recurso da Autora. No mérito, por maioria, conceder parcial provimento ao recurso da Autora para ampliar a condenação ao pagamento de horas extras, nos termos da fundamentação e determinar o pagamento de indenização por assédio moral, no valor de R$ 30.000,00".

Fonte: Justiça do Trabalho: TRT/1: RO 0046900-26.2009.5.01.0017 RJ. Órgão Julgador: Sétima Turma. Julgamento: 17 de Setembro de 2014. Relator(a): Giselle Bondim Lopes Ribeiro. Grifo nosso. 

(A imagem acima foi copiada do link Oficina de Ideias 54.) 

domingo, 23 de maio de 2021

ASSÉDIO MORAL NA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (I)

Jurisprudência para servir como pesquisa àqueles com interesse na área. Apresenta práticas abusivas e covardes no ambiente de trabalho, perpetradas rotineiramente pela Caixa Econômica Federal contra seus empregados.


INDENIZAÇÃO POR ASSÉDIO MORAL

Na Caixa Econômica Federal os empregados são obrigados e, muitas vezes, coagidos, a venderem os chamados produtos de fidelização: capitalização, previdência, seguro. Não importa em qual setor atue, você é obrigado a atingir as metas de vendas.

Como não poderia deixar de ser, este ambiente de constante assédio moral, pressão e terror psicológico afeta tanto o desenvolvimento das atividades dos empregados dentro da empresa, como a vida pessoal. 

E quem se recusa a acatar as imposições da CAIXA, não "vestindo a camisa da empresa", ou quem não consegue atingir as metas (quase sempre abusivas), sofre algum tipo de retaliação: é transferido de agência, perde a função, é preterido para as promoções.

Embora este ambiente laboral seja claramente insalubre, prejudicial e nocivo ao obreiro, nem sempre a Justiça do Trabalho, que deveria estar do lado do trabalhador, é favorável a este:

"O pedido de indenização por assédio moral foi julgado improcedente pelo juízo de origem nos seguintes termos:

... Tal prática por parte da Reclamada não constitui abuso do poder empregatício ou cobrança acima de níveis que podem ser considerados aceitáveis, porque apenas estimula os empregados a aumentarem sua produtividade, concedendo aos detentores dos melhores resultados vantagens práticas (como folgas ou a transferência para outra agência).

Não houve, portanto, conduta abusiva e/ou reiterada em prejuízo ou discriminação da Reclamante, que a degradasse em seu ambiente de trabalho ou desestimulasse a trabalhadora.

A fixação de metas de vendas ou de produtividade está inserida no exercício regular do poder empregatício, da mesma forma que a transferência entre funcionários, premiando aqueles de melhores desempenhos, insere-se no chamado jus variandi, constituindo alteração lícita das circunstâncias de cumprimento do contrato de trabalho pelo empregado... (fls. 485/486)"

Oi?!!! Como assim?!!! "níveis que podem ser considerados aceitáveis"?! "estimula os empregados a aumentarem sua produtividade"?! "Não houve, portanto, conduta abusiva"?! "fixação de metas de vendas ou de produtividade está inserida no exercício regular do poder empregatício"?! Será que eu entendi direito? A Justiça do Trabalho pensa assim sobre obrigar os empregados a cumprir metas de vendas?

E o pior é que este pensamento, de achar que "é normal, que faz parte do poder diretivo do empregador" também é comum em muitos trabalhadores, que acham que ser assediador é uma das funções/características de quem ocupa um cargo de direção, chefia ou supervisão.

Mas, afinal de contas, a CEF sai impune quando pratica assédio moral contra seus funcionários? Afortunadamente, nem sempre. No caso em tela, a Autora recorreu da decisão do juízo de origem. É o que veremos na próxima postagem. 

Fonte: Justiça do Trabalho: TRT/1: RO 0046900-26.2009.5.01.0017 RJ. Órgão Julgador: Sétima Turma. Julgamento: 17 de Setembro de 2014. Relator(a): Giselle Bondim Lopes Ribeiro.

(A imagem acima foi copiada do link Oficina de Ideias 54.)