Mostrando postagens com marcador Paulo de Tarso. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Paulo de Tarso. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 11 de setembro de 2023

SANTO AGOSTINHO - VIDA E OBRA (VIII)

Uma teoria dogmática do conhecimento


O primeiro problema filosófico, focalizado por Agostinho logo após a conversão, foi o dos fundamentos do conhecimento, para o qual necessitava urgente de uma resposta racional. Antes debatera-se dentro dos limites do ceticismo da Nova Academia platônica, dominada pelas análises de Arcesilau (315-241 a.C.) e Carnéades (214-129 a.C.), que sustentavam a tese de que não é possível encontrar um critério de evidência absoluta e indiscutível, o conhecimento limitando-se ao meramente verossímil, provável ou persuasivo.

Mas a verdade religiosa encontrada pelo bispo africano, a partir das palavras de Paulo de Tarso, era sólida e firme. Impunha-se, pois, combater os céticos e para isso o neoconverso usaria as armas do adversário. Para os céticos, a fonte de todo o conhecimento era a percepção sensível, na qual não se poderia encontrar qualquer fundamento para a certeza, já que os sentidos forneciam dados variáveis e, portanto, imperfeitos.

No retiro de Cassicíaco, logo após a conversão, Agostinho pôs-se a meditar sobre o assunto e redigiu o diálogo Contra os Acadêmicos, reabilitando, através de engenhosa argumentação, os sentidos como fonte de verdade. O erro - diz ele - provém dos juízos que se fazem sobre as sensações e não delas próprias. A sensação enquanto tal jamais é falsa. Falso é querer ver nela a expressão de uma verdade externa ao próprio sujeito. 

Assim, nenhum cético pode refutar alguém que afirme simplesmente: "Eu sei que isto me parece branco: limito-me à minha percepção e encontro nela uma verdade que não me pode ser negada". Muito diferente seria afirmar somente: "Isto é branco". Neste caso, o erro torna-se possível, no primeiro não. Assim, existiria pelo menos uma verdade absoluta, que estaria implicada no próprio ato de perceber.

Posteriormente (na Cidade de Deus), Agostinho levou a argumentação às últimas consequências e antecipou a reflexão cartesiana, formulada doze séculos depois: "Se eu me engano, eu sou, pois aquele que não é não pode ser enganado". Com isso atingia a certeza da própria existência.

Essa primeira certeza, além de fundamentar toda uma teoria dogmática do conhecimento, parecia permitir também a revelação da própria essência do ser humano: o homem seria sobretudo um ser pensante e seu pensamento não se confundiria com a materialidade do corpo.   

Fonte: Santo Agostinho. Coleção Os Pensadores. 4 ed. São Paulo: Nova Cultural, 1987.

(A imagem acima foi copiada do link Images Google.) 

domingo, 10 de setembro de 2023

SANTO AGOSTINHO - VIDA E OBRA (VII)

Fé e razão: a busca da felicidade


À síntese que realizou, ele mesmo deu a denominação de "filosofia cristã". O núcleo em torno do qual gravitam todas as suas ideias é o conceito de beatitude. O problema da felicidade constitui, para Agostinho, toda a motivação do pensar filosófico. Uma das últimas obras que redigiu, a Cidade de Deus, afirma que "o homem não tem razão para filosofar, exceto para atingir a felicidade"

A tese é defendida valendo-se de um manual de Marcus Terentius Varro (116-27 a.C.), onde se encontram definidas 288 diferentes teorias filosóficas, reais e possíveis, tendo todas em comum a mesma questão: como obter a felicidade? A filosofia é, assim, entendida não como disciplina teórica que coloca problemas à estrutura do universo físico ou à natureza dos deuses, mas como uma indagação sobre a condição humana à procura da beatitude.

A beatitude, no entanto, não foi encontrada por Agostinho nos filósofos que conhecera na juventude, mas nas Sagradas Escrituras, quando iluminado pelas palavras de Paulo de Tarso. Não foi fruto de procedimento intelectual, mas ato de intuição e de fé.

Impunha-se, portanto, conciliar as duas ordens de coisas e com isso Agostinho retorna à questão principal da Patrística, ou seja, ao problema das relações entre a razão e a fé, entre o que se sabe pela convicção interior e o que se demonstra racionalmente, entre a verdade revelada e a verdade lógica, entre a religiosidade cristã e a filosofia pagã.

Desde a conversão, Agostinho se propôs a atingir, pela fé nas Escrituras, o entendimento daquilo que elas ensinam, colocando a fé como a via de acesso à verdade eterna. Mas, por outro lado, sustentou que a fé é precedida de certo trabalho da razão. Ainda que as verdades da fé não sejam demonstráveis, isto é, passíveis de prova, é possível demonstrar o acerto de se crer nelas, e essa tarefa cabe à razão.

A razão relaciona-se, portanto, duplamente com a fé: precede-a e é sua consequência. É necessário compreender para crer e crer para compreender ("Intellige ut credas, crede ut inteligas").

Mesmo que essa tese não tenha maior rigor filosófico e soe mais como fórmula retórica do que como argumentação lógica, teve grande força, pois era um claro resultado da história pessoal de Agostinho. Antes da conversão ele andara inquieto pelos caminhos das elaborações racionais dos maniqueus, do ecletismo ciceroniano e do neoplatonismo de Plotino. Todos, especialmente o último, prepararam a explosão mística de iluminação pela fé. Depois desta, utilizou tudo o que sua cultura filosófica lhe fornecia, no sentido de racionalizar os dogmas cristãos.

A filosofia é, para Agostinho, apenas um instrumental auxiliar destinado a um fim que transcende seus próprios limites. Por isso muitos veem nele um teólogo e um místico e não propriamente um filósofo. Todavia, seu pensamento manifesta frequentemente grande penetração filosófica na análise de alguns problemas particulares e a verdade é que Agostinho conseguiu sistematizar uma grandiosa concepção do mundo, do homem e de DEUS, que se tornou, por muito tempo, a doutrina fundamental da Igreja Católica.

Fonte: Santo Agostinho. Coleção Os Pensadores. 4 ed. São Paulo: Nova Cultural, 1987.

(A imagem acima foi copiada do link Minha Biblioteca Católica.) 

sexta-feira, 25 de agosto de 2023

SANTO AGOSTINHO - VIDA E OBRA (I)

Conheça um pouco da história de Santo Agostinho, filósofo e teólogo dos primórdios do cristianismo cujas ideias tiveram grande influência no desenvolvimento da Filosofia Ocidental e do cristianismo


Em Milão, num dia qualquer de agosto de 386 da era cristã, um homem de 32 anos de idade chorava nos jardins de sua residência.

Deprimido e angustiado, estava à procura de uma resposta definitiva que lhe desse sentido para a vida. Nesse momento ouviu uma voz de criança a cantar como se fosse um refrão: "Toma e lê, toma e lê".

Levantou-se bruscamente, conteve a torrente de lágrimas, olhou em torno para descobrir de onde vinha o canto, mas não viu mais que um livro sobre uma pequena mesa. Abriu e leu a página caída por acaso sob seus olhos: 

"Não caminheis em glutonarias e embriaguez, não nos prazeres impuros do leito e em leviandades, não em contendas e emulações, mas revesti-vos de Nosso Senhor Jesus Cristo, e não cuideis da carne com demasiados desejos"

Não quis ler mais. Uma espécie de luz inundou-lhe o coração, dissipando todas as trevas da incerteza e ele correu à procura da mãe para lhe contar o sucedido. Ela exultou e bendisse ao Senhor, pois o filho estava convertido pelas palavras de Paulo de Tarso, e as portas da bem-aventurança eterna abriam-se finalmente para recebê-lo.

O caminho para a salvação vinha sendo preparado pela mãe, Mônica, desde o dia 13 de novembro de 354, quando Aurelius Augustinus nasceu, em Tagaste, na província romana da Numídia, na África.

Em Tagaste e Madura, cidadezinha próxima, Agostinho fez os primeiros estudos e deveria parar por aí, mas o pai sacrificou-se para dar ao filho a educação liberal que poderia abrir-lhe as portas do magistério ou da magistratura.

Para isso, valeu-se de um amigo rico, Romaniano, que o ajudou a enviar o rapaz para Cartago, onde completou os estudos superiores. 

Fonte: Santo Agostinho. Coleção Os Pensadores. 4 ed. São Paulo: Nova Cultural, 1987

(A imagem acima foi copiada do link Provincia Santo Tomás de Villanueva.)