segunda-feira, 28 de agosto de 2023

DIREITO ELEITORAL

Dicas para cidadãos e concurseiros de plantão.


De forma simples e direta, podemos dizer que o que conhecemos como Direito Eleitoral é um ramo do Direito Público, responsável pelas normas que regulam e disciplinam o direito político de votar, ser votado e como são realizadas as eleições.

Para Fávila Ribeiro, o Direito Eleitoral dedica-se ao estudo das normas e procedimentos que organizam e disciplinam o funcionamento do poder de sufrágio popular, de modo a se estabelecer a precisa adequação entre a vontade do povo e a atividade governamental.

Joel José Cândido, de maneira análoga, ensina que o Direito Eleitoral é o ramo do Direito Público responsável por tratar de institutos relacionados com os direitos políticos e as eleições, em todas as suas fases, como a forma de escolha dos titulares dos mandatos políticos e das instituições do Estado.

Segundo Omar Chamon, o Direito Eleitoral é ramo autônomo do Direito Público regulador dos direitos políticos e do processo eleitoral. Trata de instrumento para a efetiva democracia, ou seja, estuda a influência da vontade popular na atividade estatal. 

Bernard Maligner defende que o Direito Eleitoral é o ramo do direito que permite conferir concretude à afirmação do princípio segundo o qual a soberania nacional pertence ao povo. 

Por seu turno, há também na doutrina (Marcos Ramayana) aqueles que incluem na seara do Direito Eleitoral o chamado sistema repressivo penal, em razão dos crimes eleitorais.  

Sintetizando todas estas definições, podemos conceituar o Direito Eleitoral como sendo o ramo do Direito Público fundado por normas e princípios disciplinadores do alistamento eleitoral, da convenção partidária, do registro de candidaturas, da propaganda eleitoral, da votação, da apuração dos votos e da diplomação dos eleitos. Cuida, ainda, das ações, medidas e demais garantias necessárias ao livre exercício do sufrágio popular. 

Não restam dúvidas que o Direito Eleitoral tem maioridade como ciência autônoma, seja por ter objeto e princípios próprios, insculpidos no texto Constitucional, seja por possuir reconhecimento acadêmico como disciplina própria em cursos de graduação e pós-graduação.

Nada obstante tudo isso, este ramo do Direito Público apresenta, ainda, um vasto corpo de norma infraconstitucionais que lhes dão organização impecável.

Vale salientar que não é apenas o Direito Constitucional que fornece elementos ao Direito Eleitoral, outros ramos da ciência do Direito também o fazem. Vejamos.

O Direito Administrativo, por exemplo, orienta e dá guarida a toda uma série de atos relacionados à organização do processo eleitoral. 

Já o Direito Processual Civil é aplicado de maneira supletiva e subsidiária às disposições processuais eleitorais, possuindo indiscutíveis áreas de contato. 

O Direito Penal, por sua vez, fornece os princípios referentes à criação dos tipos penais; a teoria geral do crime e da pena e sua aplicação.    

Do Direito Processual Penal, por seu turno, provêm as regras e os princípios que disciplinam o procedimento de aplicação da pena, a fim de que seja uma garantia do indivíduo frente à grandeza do poderio estatal.

Discussões à parte, fato é que o Direito Eleitoral brasileiro, na contemporaneidade, é tão dinâmico e interdisciplinar que, não raras as vezes, encontra pontos de interseção com outras ciências do conhecimento humano.

É o que acontece, por exemplo, com as Ciências Contábeis, tão próximas em virtude dos julgamentos das prestações de contas de candidatos e partidos. Temos também a Informática, seja por causa da informatização das eleições ou mesmo das cada dia mais tecnológicas formas de se fazer propaganda. A Publicidade e a Propaganda também se fazem presentes, bem como a Comunicação Social, quando estamos no período de campanha eleitoral.   

Fonte: ALMEIDA, Roberto Moreira de. Curso de Direito Eleitoral. 11ª ed. rev., ampl. e atual. - Salvador: JusPODIVM, 2017, p. 43-44; 

JORGE, Flávio Cheim; LIBERATO, Ludgero e RODRIGUES, Marcelo Abelha. Curso de Direito Eleitoral. 2ª ed. rev., atual. e ampl. - Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, p. 33-34.


(A imagem acima foi copiada do link Oficina de Ideias 54.) 

sábado, 26 de agosto de 2023

O QUE OS INVESTIDORES DEVERIAM FAZER AGORA? (I)


"Se em algum intervalo na primeira década ou em todo o transcorrer do século XXI o mercado de ações norte-americano seguir um curso desigual em declínio, assim como poderia voltar, digamos, aos níveis de meados da década de 90 ou ainda abaixo, então os indivíduos, fundações, fundos universitários e outros beneficiários do mercado ficarão mais pobres, no agregado, em trilhões de dólares.

As perdas reais poderiam ser comparáveis à destruição total de todas as escolas do país, ou de todas as fazendas do país, ou possivelmente de todas as residências do país. 

Pode-se dizer que essa queda seria realmente inofensiva, visto que nada é fisicamente destruído por uma queda nos valores do mercado de ações; é apenas uma mudança no papel e em nossas mentes. Pode-se argumentar ainda que, se o mercado tivesse de cair pela metade, ele apenas nos traria de volta para onde estávamos alguns anos atrás, em termos do valor de mercado.

Mas há o problema de que a perda não será suportada igualmente. Alguns que viram o mercado subir e prosperar novamente deixarão de se preocupar com as ações que possuem e manterão seus lucros; outros, por terem entrado recentemente no mercado, só terão perdas. Assim, uma queda substancial no mercado deixaria algumas pessoas realmente mais pobres e outras muito ricas.  

Podemos imaginar os efeitos nas vidas daquelas pessoas que se tornaram dependentes demais das ações como investimentos e otimistas demais a respeito do desempenho desses investimentos no futuro. As pessoas que aplicaram apenas uma pequena quantia no mercado de ações para custear a educação universitária de seus filhos podem achar que sua poupança foi inadequada, que o valor da carteira caiu, ficando muito aquém do custo aumentado de uma educação universitária.

Os filhos podem ter de obter financiamentos substanciais para estudar e conseguir empregos em tempo parcial, mal remunerados, para pagar seus estudos. Ou podem decidir escolher uma carreira mais rápida, esquecendo o sonho de uma carreira em medicina, direito ou em outras profissões liberais. Podem decidir não fazer uma faculdade.

Outros, um pouco mais velhos, podem ver suas carreiras ou ambições serem frustradas. Uma vez que dispõem de menos recursos econômicos, a necessidade de manter um nível de renda e cumprir as obrigações diárias consumirá o tempo e a energia que eles esperavam dedicar à realização pessoal.

Aqueles que não economizaram praticamente nada para a aposentadoria, por acreditarem nos investimentos no mercado de ações em seus planos de aposentadoria, podem achar que os planos, juntamente com a Seguridade Social, simplesmente não fornecem a eles um padrão muito confortável de vida ao se aposentarem.

O "poder surpreendente" dos retornos compostos que se tornou uma verdade inquestionável entre tantas pessoas não se aplica se os retornos não são recebidos. Assim, aqueles com poucas economias terão de sobreviver em um mundo com muito mais idosos dependentes do que jovens. Eles podem ter de levar uma vida muito simples - e isso pode significar não sair de casa". 

Fonte: SHILLER, Robert J. Exuberância Irracional. Tradução: Maria Lucia G. L. Rosa. Título original: Irrational Exuberance. São Paulo: MAKRON Books, 2000. p. 202-204.

(A imagem acima foi copiada do link The New York Times.) 

SANTO AGOSTINHO - VIDA E OBRA (II)

Conheça um pouco da história do filósofo e teólogo dos primórdios do cristianismo cujas ideias tiveram grande influência no desenvolvimento da Filosofia Ocidental e do cristianismo: Santo Agostinho.


Agostinho não foi propriamente um bom aluno; frequentemente era espancado por gazetear e principalmente por detestar a língua grega. Como consequência, jamais pôde valer-se da leitura dos autores helênicos, não obstante se esforçasse, mais tarde para corrigir a lacuna, a fim de aprofundar-se na exegese e na teologia.

Gostava, no entanto, de ler na língua materna e toda a sua cultura se fez essencialmente latina. E foi um diálogo, hoje perdido, do clássico Cícero (106-43 a. C.), que lhe abrira as portas do saber. Chamava-se Hortensius e era um elogio da filosofia. Encantado com a elegância do estilo ciceroniano, recusava-se a ler a Bíblia, oferecida insistentemente pela mãe. As escrituras sagradas pareciam-lhe vulgares e indignas de um homem culto.

Antes, porém, de se interessar pelas questões intelectuais, sua atenção estava voltada para as coisas mundanas. Pontilhavam sua vida algumas pequenas más ações, comuns a todo adolescente, como roubar peras no quintal do vizinho pelo puro prazer de enfrentar o proibido. Mais séria, entretanto, era uma ligação amorosa que os padrões da época não permitiam terminar em casamento. Foi, no entanto, inteiramente fiel à mulher amada e com ela teve um filho. Adeodato, falecido em plena adolescência.

Não eram só o prazer dos sentidos e o interesse pela filosofia os centros de sua vida, ao findar a adolescência. Antes dos vinte anos, faleceu o pai e Agostinho viu-se com pesados encargos de chefe de duas famílias. Voltou, então, para Tagaste e abriu uma escola, logo depois transferindo-se de novo para Cartago, a fim de ocupar o cargo de professor da cadeira municipal de retórica, como impunha a legislação dos imperadores romanos a todas as cidades. 

Como professor foi excelente, a crer nos testemunhos de Favônio Eulógio, retórico e até certo ponto filósofo, que sucederia ao mestre na mesma cátedra, e no de Alípio, amigo íntimo, companheiro de conversão e colega de episcopado, nos anos seguintes.

A maior parte dos alunos, no entanto, fazia os cursos apenas para cumprir obrigações familiares e sociais e, consequentemente, não se interessava muito pelas aulas. Cansado de ser irritado por uma juventude turbulenta, depois de quase dez anos Agostinho resolveu mudar para Roma.

Enquanto não pôde transferir-se para Roma, continuou dedicado à filosofia, apesar de limitado pela ignorância do grego, a língua mais culta da época. Assim, leu as Categorias de Aristóteles (384-322 a. C.), mas em tradução latina e sem a indispensável introdução de Porfírio (c. 233-304). Estava limitado também pela impossibilidade de estudar nos melhores centros, como Atenas e Alexandria. Deixou-se, então, seduzir pelas doutrinas dos maniqueus, que afirmavam a existência absoluta de dois princípios, o bem e o mal, a luz e as trevas. 

Esperou ansiosamente pela visita de Fausto, um dos chefes da seita e homem louvado por sua alta sabedoria. O encontro, no entanto, foi decepcionante do ponto de vista das indagações intelectuais do discípulo, muito embora reconhecesse a simpatia e a capacidade de convencer do mestre, além de sua sinceridade.

Fonte: Santo Agostinho. Coleção Os Pensadores. 4 ed. São Paulo: Nova Cultural, 1987

(A imagem acima foi copiada do link Hallow.) 

sexta-feira, 25 de agosto de 2023

EXPLORAÇÃO DE GÁS CANALIZADO - JÁ FOI COBRADO EM PROVA

(CESPE / CEBRASPE - 2022 - TCE-RJ - Técnico de Controle Externo) No tocante à organização político-administrativa do Estado brasileiro, julgue o item a seguir.

Em hipóteses excepcionais, é permitida a edição de medida provisória para regulamentar a exploração dos serviços de gás canalizado em determinado estado. 

Certo    (  )

Errado  (  )


Gabarito: Errado. De acordo com a Carta da República, não é permitida:

Art 25. § 2º Cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante concessão, os serviços locais de gás canalizado, na forma da lei, vedada a edição de medida provisória para a sua regulamentação.

Essa eu errei...

(A imagem acima foi copiada do link Google Images.) 

SANTO AGOSTINHO - VIDA E OBRA (I)

Conheça um pouco da história de Santo Agostinho, filósofo e teólogo dos primórdios do cristianismo cujas ideias tiveram grande influência no desenvolvimento da Filosofia Ocidental e do cristianismo


Em Milão, num dia qualquer de agosto de 386 da era cristã, um homem de 32 anos de idade chorava nos jardins de sua residência.

Deprimido e angustiado, estava à procura de uma resposta definitiva que lhe desse sentido para a vida. Nesse momento ouviu uma voz de criança a cantar como se fosse um refrão: "Toma e lê, toma e lê".

Levantou-se bruscamente, conteve a torrente de lágrimas, olhou em torno para descobrir de onde vinha o canto, mas não viu mais que um livro sobre uma pequena mesa. Abriu e leu a página caída por acaso sob seus olhos: 

"Não caminheis em glutonarias e embriaguez, não nos prazeres impuros do leito e em leviandades, não em contendas e emulações, mas revesti-vos de Nosso Senhor Jesus Cristo, e não cuideis da carne com demasiados desejos"

Não quis ler mais. Uma espécie de luz inundou-lhe o coração, dissipando todas as trevas da incerteza e ele correu à procura da mãe para lhe contar o sucedido. Ela exultou e bendisse ao Senhor, pois o filho estava convertido pelas palavras de Paulo de Tarso, e as portas da bem-aventurança eterna abriam-se finalmente para recebê-lo.

O caminho para a salvação vinha sendo preparado pela mãe, Mônica, desde o dia 13 de novembro de 354, quando Aurelius Augustinus nasceu, em Tagaste, na província romana da Numídia, na África.

Em Tagaste e Madura, cidadezinha próxima, Agostinho fez os primeiros estudos e deveria parar por aí, mas o pai sacrificou-se para dar ao filho a educação liberal que poderia abrir-lhe as portas do magistério ou da magistratura.

Para isso, valeu-se de um amigo rico, Romaniano, que o ajudou a enviar o rapaz para Cartago, onde completou os estudos superiores. 

Fonte: Santo Agostinho. Coleção Os Pensadores. 4 ed. São Paulo: Nova Cultural, 1987

(A imagem acima foi copiada do link Provincia Santo Tomás de Villanueva.) 

A INTERPRETAÇÃO DO ART. 14, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO (III)

Mais bizus para cidadãos e concurseiros de plantão, retirados do RE 637.485/RJ.


Em Sessão do dia 17 de dezembro de 2008, o Tribunal Superior Eleitoral, ao julgar o Recurso Especial Eleitoral n. 32.507 (Rel. Min. Eros Grau) modificou sua antiga jurisprudência, passando a adotar o seguinte entendimento, bem resumido em trecho do voto do Ministro Carlos Britto:

“(...) o princípio republicano está a inspirar a seguinte interpretação basilar dos §§ 5º e 6º do art. 14 da Carta Política: somente é possível eleger-se para o cargo de ‘prefeito municipal’ por duas vezes consecutivas. Após isso, apenas permite-se, respeitado o prazo de desincompatibilização de 6 meses, a candidatura a ‘outro cargo’, ou seja, a mandato legislativo, ou aos cargos de Governador de Estado ou de Presidente da República; não mais de Prefeito Municipal, portanto”

Na mesma ocasião, o TSE julgou o Recurso Especial Eleitoral n. 32.539 e igualmente adotou o novo entendimento, resumido na seguinte ementa:

“RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. MUDANÇA DE DOMICÍLIO ELEITORAL. ‘PREFEITO ITINERANTE’. EXERCÍCIO CONSECUTIVO DE MAIS DE DOIS MANDATOS DE CHEFIA DO EXECUTIVO EM MUNICÍPIOS DIFERENTES. IMPOSSIBILIDADE. INDEVIDA PERPETUAÇÃO NO PODER. OFENSA AOS §§ 5º E 6º DO ART. 14 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. NOVA JURISPRUDÊNCIA DO TSE. Não se pode, mediante a prática de ato formalmente lícito (mudança de domicílio eleitoral), alcançar finalidades incompatíveis com a Constituição: a perpetuação no poder e o apoderamento de unidades federadas para a formação de clãs políticos ou hegemonias familiares. O princípio republicano está a inspirar a seguinte interpretação basilar dos §§ 5º e 6º do art. 14 da Carta Política: somente é possível eleger-se para o cargo de ‘prefeito municipal’ por duas vezes consecutivas. Após isso, apenas permite-se, respeitado o prazo de desincompatibilização de 6 meses, a candidatura a ‘outro cargo’, ou seja, a mandato legislativo, ou aos cargos de Governador de Estado ou de Presidente da República; não mais de Prefeito Municipal, portanto. Nova orientação jurisprudencial do Tribunal Superior Eleitoral, firmada no Respe 32.507”

O novo entendimento do TSE parte do pressuposto de que a mudança do domicílio eleitoral para o Município Y, por quem já exerceu dois mandatos consecutivos como Prefeito do Município X, configura fraude à regra constitucional que proíbe uma segunda reeleição (art. 14, § 5º). A prática de um ato aparentemente lícito (a mudança do domicílio eleitoral) configuraria, em verdade, um desvio de finalidade, uma clara burla à regra constitucional visando à monopolização do poder local. Analisemos os fundamentos da decisão do TSE para verificar a sua consistência.

O argumento baseado nas noções de “fraude à lei” (à regra constitucional do art. 14, § 5º), “abuso do direito” (direito de transferir o domicílio eleitoral), “desvio de finalidade” (finalidade do direito à fixação do domicílio eleitoral) é plenamente válido quando utilizado em casos concretos cujas circunstâncias fáticas demostrem um estado de coisas com as seguintes características: 1) os municípios possuem territórios limítrofes ou muito próximos, permitindo pressupor a existência de uma mesma microrregião eleitoral, formada por um eleitorado com características comuns e igualmente influenciado pelos mesmos grupos políticos atuantes nessa região; 2) os municípios têm uma origem comum, resultantes de desmembramento, incorporação ou fusão, conforme o art. 18, § 4º, da Constituição. 

Nessas hipóteses, é possível criar-se uma presunção jurídica (juris tantum) no sentido de que o ato de transferência do domicílio eleitoral do Município X para o Município Y, por parte do cidadão que, por duas vezes consecutivas, exerceu o mandato de Chefe do Poder Executivo no Município X, foi realizado em fraude à regra constitucional do art. 14, § 5º, visando alcançar uma finalidade com ela incompatível, isto é, a perpetuação de uma mesma pessoa no poder local.

Não obstante, o argumento não é generalizável e, dessa forma, não é válido para outras várias situações, como as que se configuram quando os municípios: (3) pertencem ao mesmo Estado-membro, mas são territorialmente distantes o bastante para se pressupor que possuem bases eleitorais e grupos políticos completamente distintos; e (4) estão situados em diferentes Estados-membros e estão territorialmente distantes. 

Ressalte-se que tais hipóteses são plenamente possíveis, em razão do conceito amplo de domicílio eleitoral adotado pela Justiça Eleitoral, que permite que o cidadão possa legitimamente manter, ao longo de sua vida política, distintos domicílios conforme mantenha vínculos econômicos ou afetivos em diversas localidades dentro do território brasileiro. Pense-se, por exemplo, no filho de pais separados, um (o pai) residindo no Acre e o outro (a mãe) com domicílio residencial fixo no Rio Grande do Sul, fato que legitima o desenvolvimento simultâneo de dois fortes vínculos domiciliares (no conceito do Direito Eleitoral) por um mesmo cidadão e, dessa forma, torna possível a sua candidatura tanto no Acre como no Rio Grande do Sul. 

Imagine-se, igualmente, o cidadão que passou os vinte primeiros anos de vida em sua cidade natal no interior do Ceará e depois resolveu ir cursar a universidade e construir sua vida profissional em São Paulo, tornando legítima a fixação de seu domicílio eleitoral tanto em um como em outro Estado da federação. As situações são diversas e variadas e, nesses casos, a existência de dois domicílios eleitorais não é fruto de qualquer estratégia política de grupos ou partidos, mas um simples resultado da contingência da vida privada individual. 

O fato é que, nas hipóteses acima descritas (3 e 4), não se poderia pressupor que a transferência de domicílio, com vistas à nova eleição em outro município, visaria à perpetuação do mesmo poder político na mesma microrregião eleitoral. 

A antiga jurisprudência do TSE, apesar de permitir uma “terceira” eleição em Município diverso, sempre excepcionou as hipóteses em que os municípios envolvidos estivessem localizados numa mesma microrregião eleitoral e fossem resultado de desmembramento, incorporação ou fusão de municípios. 

Portanto, não seria inteiramente novo, ou pelo menos não seria razão suficiente para uma modificação radical na jurisprudência, o argumento que constata a fraude à regra constitucional pelo ato de transferência do domicílio eleitoral visando à perpetuação de um mesmo indivíduo ou grupo político no poder local. O argumento que assim se constrói com base na monopolização do poder regional ou no “apoderamento de unidades federadas” seria inválido quando aplicado às hipóteses acima descritas em que o cidadão transfere seu domicílio de um Município no Acre para um Município no Rio Grande do Sul, ou do Ceará para São Paulo.

Como o entendimento jurisprudencial que se constrói deve valer não apenas para os casos concretos específicos que são objeto das decisões paradigmas, mas para todos os demais casos em tese, parece certo então que devemos procurar fundamentos que sejam generalizáveis o bastante para justificar a aplicação do entendimento fixado em casos futuros com as mesmas características. 

Fossem as hipóteses de sucessivas reeleições em municípios pertencentes a uma mesma microrregião (hipóteses 1 e 2 acima explicadas) as únicas circunstâncias relevantes a serem tratadas pela jurisprudência, não haveria dúvida a respeito da plena suficiência dos argumentos adotados pelo TSE. No entanto, como explicado, a questão constitucional posta é mais ampla e abarca uma gama mais variada de situações que não se circunscrevem à sucessiva eleição em municípios vizinhos, o que faria pressupor a monopolização do poder regional ou local, em clara violação à Constituição.

Fonte: STF - RE 637.485/RJ. Rel.: MIN. GILMAR MENDES. Plenário. 01/08/2012

(A imagem acima foi copiada do link Oficina de Ideias 54.)