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quarta-feira, 19 de julho de 2023

COMPETÊNCIAS DOS MUNICÍPIOS - QUESTÃO PARA TREINAR

(VUNESP - 2023 - Câmara de Santa Bárbara D'Oeste - SP - Procurador Legislativo) Acerca das competências dos Municípios, pode-se corretamente afirmar que

A) em razão do interesse local preponderante, a lei municipal pode estabelecer limitações à instalação de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área.

B) a fixação de horário para o funcionamento de estabelecimento comercial não pode ser disciplinada por meio de lei municipal, tendo em vista que o Município não tem competência para legislar sobre Direito Empresarial.

C) o feriado do Dia da Consciência Negra não pode ser estabelecido por lei municipal, tendo em vista que representa um símbolo de resistência cultural e configura ação afirmativa contra o preconceito racial que ultrapassa o interesse local.

D) cabe aos municípios promover o licenciamento ambiental das atividades ou empreendimentos que possam causar impacto ambiental de âmbito local.

E) a definição do tempo máximo de espera de clientes em filas de instituições bancárias não pode ser feita por lei municipal.


Gabarito: assertiva D. Analisemos os enunciados:

A: incorreta. Lei municipal não pode estabelecer tal limitação, sob pena de ofender o princípio da livre concorrência. 

Súmula vinculante 49: Ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que impede a instalação de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área.

B: incorreta. O Município pode, sim, disciplinar tal matéria, pois possui competência para tanto.

Súmula vinculante 38: É competente o Município para fixar o horário de funcionamento de estabelecimento comercial.

C: incorreta. O Município pode instituir tal feriado. É, sim, constitucional lei municipal que institua feriado local para comemorar o Dia da Consciência Negra. 

É constitucional a instituição, por lei municipal, de feriado local para a comemoração do Dia da Consciência Negra, a ser celebrado em 20 de novembro, em especial porque a data representa um símbolo de resistência cultural e configura ação afirmativa contra o preconceito racial. (Informativo 1078, STF, p. 8).

EMENTA: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. CONVERSÃO DE APRECIAÇÃO DA CAUTELAR EM JULGAMENTO DE MÉRITO. ARTS. 1º, 2º, 3º E 4º DA LEI N. 13.707/2004 E ART. 9º DA LEI N. 14.485/2007 DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO. INSTITUIÇÃO DO FERIADO MUNICIPAL COMEMORATIVO DO DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA. COMPETÊNCIA MUNICIPAL PARA INSTITUIÇÃO DE FERIADO DE ALTA SIGNIFICAÇÃO ÉTNICA. INTERESSE LOCAL. INC. I DO ART. 30 E §2º DO ART. 215 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. ARGUIÇÃO PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESTA PARTE, JULGADA PROCEDENTE PARA DECLARAR CONSTITUCIONAL O ART. 9o. DA LEI MUNICIPAL PAULISTANA N. 14.485, QUE ESTABELECE O FERIADO MUNICIPAL DO DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão do Plenário, por unanimidade, converter a apreciação do pleito de medida cautelar em julgamento de mérito. Por maioria, conhecer da arguição de descumprimento de preceito fundamental apenas quanto ao art. 9º da Lei 14.485/2007 do Município de São Paulo e, na parte conhecida, julgar procedente o pedido formulado, declarando constitucional esse dispositivo, pelo qual instituído o feriado do dia da consciência negra, nos termos do voto da Relatora, vencidos os Ministros André Mendonça e Nunes Marques, que não conheciam da ADPF e, vencidos, julgavam improcedente o pedido. (ADPF 634/SP. Relatora: Ministra Cármen Lúcia.)  

D: CORRETA, devendo ser assinalada. (STF - Informativo nº 1060/2022)

Cabe aos municípios promover o licenciamento ambiental das atividades ou empreendimentos que possam causar impacto ambiental de âmbito local. Com amparo nas regras de repartição de competências, o entendimento desta Corte se firmou no sentido de que o município é competente para legislar sobre o meio ambiente com a União e o estado no limite do seu interesse local e desde que tal regramento seja harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (CF/1988, art. 24, VI c/c o art. 30, I e II).

A Política Nacional do Meio Ambiente, estabelecida pela Lei 6.938/1981, expressamente prevê que dependem de licenciamento ambiental a construção, a instalação, a ampliação e o funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes de causar degradação ambiental sob qualquer forma. Nesse contexto, o conjunto normativo e a jurisprudência acerca do tema reforçam a referida competência municipal e a sua importância.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou procedente a ação para conferir interpretação conforme a Constituição Federal ao art. 264 da Constituição do Estado do Ceará (5), no sentido de que a aplicação do dispositivo deve se limitar à estrutura político-administrativa do Estado do Ceará, ficando resguardadas as competências administrativa e legislativa dos municípios relativas ao licenciamento de atividades e empreendimentos de impacto local. (ADI 2142/CE, relator Min. Roberto Barroso, julgamento virtual finalizado em 24.6.2022 (sexta-feira), às 23:59).

E: incorreta. Foi a tese firmada no leading case RE 610221

Tema 272 - Competência dos Municípios para legislar sobre tempo máximo de espera de clientes em filas de bancos. Tese: Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local, notadamente sobre a definição do tempo máximo de espera de clientes em filas de instituições bancárias. [STF. Plenário virtual. RE 610221 RG, Rel. Min. Ellen Gracie, julgado em 29/04/2010 (repercussão geral)].

(A imagem acima foi copiada do link Images Google.) 

quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL - CONSIDERAÇÕES

Dicas para cidadãos e concurseiros de plantão.


O que é Reclamação Constitucional

Primeiramente, cabe registrar que ela não é, recurso ou sucedâneo recursal. De acordo com a Constituição Federal, arts. 102, I, "l" e 105, I, "f", a Reclamação Constitucional é instrumento processual que as partes têm à disposição para assegurar que as decisões judiciais não discrepem dos entendimentos já proferidos pelo Supremo Tribunal Federal, em recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou em recursos repetitivos; pelo Superior Tribunal de Justiça nesse último caso; e pelos Tribunais de segunda instância para salvaguarda de decisões colegiadas proferidas em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência.

Hipóteses de cabimento

A Reclamação Constitucional possui previsão na Constituição Federal, na Lei 11.417/06 e no Código de Processo Civil, com as respectivas hipóteses de cabimento.

De acordo com a CF/88, será cabível a reclamação constitucional nas seguintes hipóteses, a saber:  

Art. 102 Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

I - processar e julgar, originariamente: 

[...]

l) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões;

Art. 103-A. 

[...]

§ 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso. 

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:  

I - processar e julgar, originariamente:

[...] 

f) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões;

A Lei nº11.417/2006 também aduz:  

Art. 7º Da decisão judicial ou do ato administrativo que contrariar enunciado de súmula vinculante, negar-lhe vigência ou aplicá-lo indevidamente caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal, sem prejuízo dos recursos ou outros meios admissíveis de impugnação

No CPC, a disciplina infraconstitucional da Reclamação Constitucional está prevista nos artigos 988 a 993. Vejamos os pontos principais:

Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para:  

I - preservar a competência do tribunal;  

II - garantir a autoridade das decisões do tribunal;  

III – garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; 

IV – garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência;

§ 1º A reclamação pode ser proposta perante qualquer tribunal, e seu julgamento compete ao órgão jurisdicional cuja competência se busca preservar ou cuja autoridade se pretenda garantir.  

§ 2º A reclamação deverá ser instruída com prova documental e dirigida ao presidente do tribunal.  

§ 3º Assim que recebida, a reclamação será autuada e distribuída ao relator do processo principal, sempre que possível. 

§ 4º As hipóteses dos incisos III e IV compreendem a aplicação indevida da tese jurídica e sua não aplicação aos casos que a ela correspondam.  

§ 5º É inadmissível a reclamação:

I – proposta após o trânsito em julgado da decisão reclamada;

II – proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias. 

§ 6º A inadmissibilidade ou o julgamento do recurso interposto contra a decisão proferida pelo órgão reclamado não prejudica a reclamação.

Também importa ressaltar que, de acordo com a Súmula 734 - STF:

Não cabe reclamação quando já houver transitado em julgado o ato judicial que se alega tenha desrespeitado decisão do Supremo Tribunal Federal.

Desse modo, a parte interessada e o Ministério Público têm, até o trânsito em julgado da decisão que pretendem rescindir para ajuizar a Reclamação Constitucional, conforme a súmula acima, sob pena da necessidade de utilização de ação rescisória.

PRAZO

Não há prazo processual para o ingresso da reclamação constitucional. Entretanto, conforme apontado alhures, o STF entende que não cabe tal instituto processual contra decisão transitada em julgado, uma vez que nesse caso assumiria natureza rescisória.  

Além do mais, nos termos do também já citado art. 988, § 5º do NCPC, com redação alterada com a Lei nº 13.256, de 2016, é inadmissível a reclamação:  proposta após o trânsito em julgado da decisão reclamada; e, proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias.

Fonte: ABI-ACKEL Advogados Associados; JusBrasil.

(A imagem acima foi copiada do link Oficina de Ideias 54.) 

quinta-feira, 6 de setembro de 2018

JUIZ BOCA DA LEI

Para cidadãos e concurseiros de plantão


A expressão "bouche de la loi" ('boca da lei') foi muito utilizada na França após a Revolução Francesa (1789).

Dizia-se, então, que os juízes deveriam ser "bouches de la loi" no sentido de que deveriam apenas aplicar, da forma mais mecânica possível, as leis editadas pelo Legislativo.

Justificou-se esse cerceamento ao Judiciário com o fato dos juízes franceses terem extrapolado de suas atribuições, assumindo atitudes questionadoras frente ao rei Luís XVI.

Os juízes passaram a ser considerados 'perigosos' tanto pelos monarquistas quanto pelos revolucionários (republicanos).

Na verdade, o que preocupava tanto uns quanto outros era o fato de trataram-se eles de pessoas esclarecidas, não-manipuláveis...

De lá para cá os juízes franceses têm sofrido, dos sucessivos governos, restrições, que prejudicam o fortalecimento do Judiciário.

Todavia, transformar os juízes em meras 'bocas da lei' é rebaixar essa instituição, tratando seus membros como meros funcionários administrativos, que resumem seu trabalho em cumprir regulamentos...

Não se pretende a implantação de verdadeira 'babel' com a possibilidade de cada juiz decidir arbitrariamente, mas sim que os Tribunais Superiores definam entendimentos jurisprudenciais uniformes (súmulas vinculantes). Significaria isso a nossa passagem gradativa do sistema de "civil law" para o de "common law".

Somente o Judiciário deveria ser incumbido das questões jurídicas, não só julgando as questões jurídicas (como já acontece no nosso país), mas também aplicando nos casos concretos sua jurisprudência baseada nos antecedentes consolidados, restringindo-se a atividade do Legislativo à edição apenas das leis indispensáveis.

No Brasil, o Legislativo legisla exageradamente, perdendo tempo enorme com leis desnecessárias, enquanto que o Executivo também se aventura pela área legislativa, aumentando desmesuradamente a 'babel legislativa'.

'Bocas da lei' devem ser os servidores administrativos, que devem restringir sua atuação à aplicação de regulamentos, portarias etc.

Para benefício dos cidadãos, é importante que os juízes sejam muito mais do que isso, contribuindo para o progresso social da sociedade, fazendo avançar o Direito no rumo da liberdade, igualdade e fraternidade, que é um ideal universal e não apenas da nação francesa.

É importante que as pessoas reflitam sobre a utilidade de um Judiciário que não seja mera 'boca da lei', como aconteceu durante os regimes antidemocráticos...



* Luiz Guilherme Marques, Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG).



(A imagem acima foi copiada do link Oficina de Ideias 54.)