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quarta-feira, 17 de julho de 2024

RESOLUÇÃO Nº 454/2022 DO CNJ (V)

Hoje, concluiremos o estudo da Resolução nº 454/2022, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a qual estabelece diretrizes e procedimentos para efetivar a garantia do direito ao acesso ao Judiciário de pessoas e povos indígenas. Dentre outras coisas, concluiremos o tópico referente às especificidades do acesso à Justiça dos povos indígenas e falaremos dos direitos das crianças indígenas. 


Art. 18. Nas ações judiciais, inclusive possessórias, cuja discussão venha alcançar terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, deve ser dada ciência ao povo indígena interessado, com instauração de diálogo interétnico e intercultural, e oficiados à Funai e ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), para que informem sobre a situação jurídica das terras

Parágrafo único. Recomenda-se à autoridade judicial cautela na apreciação de pleitos de tutelas provisória de urgência que impliquem remoções ou deslocamentos, estimulando sempre o diálogo interétnico e intercultural

Art. 19. Sempre que for necessário esclarecer algum ponto em que a escuta da comunidade seja relevante, a autoridade judicial poderá recorrer a audiências públicas ou inspeções judiciais, respeitadas as formas de organização e deliberação do grupo

Parágrafo único. A organização das audiências e das inspeções em territórios indígenas será feita em conjunto com a comunidade, de forma a respeitar seus ritos e tradições, sem prejuízo da observância das formalidades processuais. 

DOS DIREITOS DAS CRIANÇAS INDÍGENAS

Art. 20. Os órgãos do Poder Judiciário observarão o disposto no art. 231 da Constituição Federal, no art. 30 da Convenção sobre Direitos da Criança e no ECA quanto à determinação do interesse superior da criança, especialmente, o direito de toda criança indígena, em comum com membros de seu povo, de desfrutar de sua própria cultura, de professar e praticar sua própria religião ou de falar sua própria língua. 

Art. 21. Em assuntos relativos ao acolhimento familiar ou institucional, à adoção, à tutela ou à guarda, devem ser considerados e respeitados os costumes, a organização social, as línguas, as crenças e as tradições, bem como as instituições dos povos indígenas

§ 1º A colocação familiar deve ocorrer prioritariamente no seio de sua comunidade ou junto a membros do mesmo povo indígena, ainda que em outras comunidades

§ 2º O acolhimento institucional ou em família não indígena deverá ser medida excepcional a ser adotada na impossibilidade, devidamente fundamentada, de acolhimento nos termos do parágrafo § 1º deste artigo, devendo ser observado o mesmo para adoção, tutela ou guarda em famílias não indígenas

§ 3º Na instrução processual, deverão ser observadas as disposições da Resolução CNJ no 299/2019 sobre as especificidades de crianças e adolescentes pertencentes a povos e comunidades tradicionais, vítimas ou testemunhas de violência.

DAS DISPOSIÇÕES FINAIS 

Art. 22. Na hipótese em que o CNJ seja instado a atuar para a implementação de deliberações e recomendações da Corte Interamericana de Direitos Humanos e outros órgãos internacionais de direitos humanos, os povos e as comunidades indígenas afetados serão ouvidos pela Unidade de Monitoramento e Fiscalização instituída pela Resolução CNJ no 364/2021, com a finalidade de compreender a sua perspectiva em relação aos pontos que são objeto do litígio. 

Art. 23. O CNJ elaborará Manual voltado à orientação dos tribunais e magistrados quanto à implementação das medidas previstas nesta Resolução.

Art. 24. Para o cumprimento do disposto nesta Resolução, os tribunais, em colaboração com as escolas de magistratura, promoverão cursos destinados à permanente qualificação e atualização funcional dos magistrados e serventuários, notadamente nas comarcas e seções judiciárias com maior população indígena. 

Parágrafo único. A Presidência do CNJ encaminhará à Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) proposta de inclusão do presente ato normativo e das Resoluções CNJ no 287/2019 e 299/2019, no conteúdo programático obrigatório dos cursos de ingresso e vitaliciamento na magistratura. 

Art. 25. As informações relativas aos povos isolados e de recente contato, disponibilizadas pela Funai por meio de dados abertos, passarão a integrar o painel interativo nacional de dados ambiental e interinstitucional (SireneJud), instituído pela Resolução Conjunta CNJ/CNMP no 8/2021, para consulta pela autoridade judicial. 

Art. 26. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

Ministro LUIZ FUX 

(A imagem acima foi copiada do link Pinterest.)

segunda-feira, 15 de julho de 2024

RESOLUÇÃO Nº 454/2022 DO CNJ (IV)

Outros bizus da Resolução nº 454/2022, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a qual estabelece diretrizes e procedimentos para efetivar a garantia do direito ao acesso ao Judiciário de pessoas e povos indígenas. Hoje, continuaremos o tópico referente às especificidades do acesso à Justiça dos povos indígenas.


Art. 13. Para garantir o devido processo legal e assegurar a compreensão da linguagem e dos modos de vida dos povos indígenas, a instrução processual deve compatibilizar as regras processuais com as normas que dizem respeito à organização social, à cultura, aos usos e costumes e à tradição dos povos indígenas, com diálogo interétnico e intercultural

Parágrafo único. O diálogo interétnico e intercultural deve ser feito por meio de linguagem clara e acessível, mediante mecanismos de escuta ativa e direito à informação

Art. 14. Quando necessário ao fim de descrever as especificidades socioculturais do povo indígena e esclarecer questões apresentadas no processo, o juízo determinará a produção de exames técnicos por antropólogo ou antropóloga com qualificação reconhecida

§ 1º Compreendem-se por exames técnicos antropológicos trabalhos que demandem a produção de pareceres sob forma de relatórios técnico-científicos, perícias e informes técnicos cuja elaboração pressupõe algum tipo de estudo ou pesquisa no âmbito do conhecimento especializado da Antropologia. 

§ 2º Na designação de antropólogo ou antropóloga, deve-se priorizar profissional que possua conhecimentos específicos sobre o povo a que se atrela o processo judicial. 

§ 3º Os órgãos do Poder Judiciário poderão realizar parcerias com universidades, associações científicas e entidades de classe para garantir a indicação de profissionais habilitados para a elaboração de laudos periciais antropológicos. 

§ 4º Os laudos dos exames técnicos previstos no caput deste artigo observarão o seguinte conteúdo mínimo:

I – descrição dos achados, preferencialmente com base no trabalho in loco, que possibilitem a compreensão da pessoa, do grupo ou do povo indígena periciado, com registros de sua cosmovisão, crenças, costumes, práticas, valores, interação com o meio ambiente, territorialidade, interações sociais recíprocas, organização social e outros fatores vinculados à sua relação com a sociedade envolvente; 

II – realização de entrevistas com a parte ou comunidade indígena, descrevendo todos os elementos indispensáveis para a certificação das condições socioculturais da pessoa, do grupo ou do povo indígena examinado; 

III – relação dos documentos analisados e outros elementos que contribuam para o conjunto probatório; 

IV – no caso de processos criminais, os requisitos previstos no art. 6º da Resolução CNJ nº 287/2019. 

§ 5º Recomenda-se que a admissibilidade do exame técnicoantropológico não seja fundamentada em supostos graus de integração de pessoas e comunidades indígenas à comunhão nacional.

Art. 15. Diante das especificidades culturais dos povos indígenas, devem ser priorizados os atos processuais sob a forma presencial, devendo a coleta do depoimento das pessoas indígenas ser realizada, sempre que possível e conveniente aos serviços judiciários, no próprio território do depoente.

Art. 16. Recomenda-se a admissão de depoimentos de partes e testemunhas indígenas em sua língua nativa

§ 1º Caso tome o depoimento em língua diversa, o magistrado assegurarse-á de que o depoente bem compreende o idioma. 

§ 2º Será garantido intérprete ao indígena, escolhido preferencialmente dentre os membros de sua comunidade, podendo a escolha recair em não indígena quando esse dominar a língua e for indicado pelo povo ou indivíduo interessado

Art. 17. O Ministério Público e a Funai serão intimados para manifestar interesse de intervir nas causas de interesse dos povos indígenas, suas comunidades e organizações. 

Parágrafo único. Na falta ou insuficiência da representação, a Defensoria Pública será cientificada

(A imagem acima foi copiada do link Notícias Acreana.)  

RESOLUÇÃO Nº 454/2022 DO CNJ (III)

Mais dicas da Resolução nº 454/2022, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a qual estabelece diretrizes e procedimentos para efetivar a garantia do direito ao acesso ao Judiciário de pessoas e povos indígenas. Hoje, falaremos do diálogo interétnico e intercultural, da territorialidade indígena, da vedação da aplicação do regime tutelar, do respeito aos povos em isolamento voluntário e começaremos o tópico referente às especificidades do acesso à Justiça dos povos indígenas.


Do diálogo interétnico e intercultural 

Art. 5º Diálogo interétnico e intercultural consiste em instrumentos de aproximação entre a atuação dos órgãos que integram o Sistema de Justiça, especialmente os órgãos do Poder Judiciário, com as diferentes culturas e as variadas formas de compreensão da justiça e dos direitos, inclusive mediante a adoção de rotinas e procedimentos diferenciados para atender as especificidades socioculturais desses povos.

Da territorialidade indígena

Art. 6º A territorialidade indígena decorre da relação singular desses povos com os espaços necessários à sua reprodução física e cultural; aspectos sociais e econômicos; e valores simbólicos e espirituais, sejam eles utilizados de forma permanente ou temporária, nos termos do art. 231 da Constituição Federal, do art. 13 da Convenção nº 169/OIT e do art. 25 da Lei nº 6.001/1973.

Da vedação da aplicação do regime tutelar 

Art. 7º A vedação da aplicação do regime tutelar corresponde ao conjunto de ações destinadas à participação e ao reconhecimento da capacidade processual indígena e ao dimensionamento adequado das atribuições dos órgãos e entes responsáveis por políticas indigenistas, os quais não substituem a legitimidade direta dos indígenas, suas comunidades e organizações para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses

Parágrafo único. A atuação da Funai ou do Ministério Público Federal em causas sobre direitos indígenas não supre a necessidade de manifestação do povo interessado.

Do respeito aos povos em isolamento voluntário 

Art. 8º O Poder Judiciário deve garantir a não aproximação por terceiros aos povos isolados, uma vez que a eventual iniciativa de contato deve partir exclusivamente desses povos, em atenção ao princípio da autodeterminação e ao direito aos usos, costumes e tradições, resguardados pela Constituição Federal

§ 1º Os povos indígenas isolados e de recente contato estão sujeitos a vulnerabilidades específicas, de ordem epidemiológica, territorial, demográfica, sociocultural e política, que aumentam sobremaneira o risco de morte, devendo tal condição ser considerada no âmbito do processo judicial.

§ 2º A política judiciária destinada a esses povos deve atender as diretrizes e estratégias específicas e respeitar os princípios da precaução e da prevenção, de forma a preservar o contato preconizado no caput deste artigo

Art. 9º Havendo indícios de que um processo judicial pode afetar povos ou terras tradicionalmente ocupadas por indígenas, a Funai deverá ser instada a informar se o caso atinge, ainda que de forma potencial, os direitos de povos isolados ou de recente contato, assim como se existe restrição de uso vigente no referido território

Parágrafo único. O questionamento mencionado no caput deste artigo poderá ser igualmente feito a organizações indígenas de âmbito local, regional ou nacional.

DAS ESPECIFICIDADES DO ACESSO À JUSTIÇA DOS POVOS INDÍGENAS 

Art. 10. Para os fins desta Resolução, o ingresso em juízo de povos indígenas, suas comunidades e organizações em defesa de seus direitos e interesses independe de prévia constituição formal como pessoa jurídica

Parágrafo único. Os povos indígenas, suas comunidades e organizações possuem autonomia para constituir advogado ou assumir a condição de assistido da Defensoria Pública nos processos de seu interesse, conforme sua cultura e organização social

Art. 11. São extensivos aos interesses dos povos, comunidades e organizações indígenas as prerrogativas da Fazenda Pública, quanto à impenhorabilidade de bens, rendas e serviços, ações especiais, prazos processuais, juros e custas, a teor do art. 40 c/c o art. 61 da Lei no 6.001/1973.

Art. 12. Dar-se-á preferência à forma pessoal para as citações de indígenas, suas comunidades ou organizações

§ 1º A atuação do Ministério Público e da Defensoria Pública nos processos que envolvam interesses dos indígenas não retira a necessidade de intimação do povo interessado para viabilizar sua direta participação, ressalvados os povos isolados e de recente contato.

§ 2º A comunicação será realizada por meio de diálogo interétnico e intercultural, de forma a assegurar a efetiva compreensão, pelo povo ou comunidade, do conteúdo e consequências da comunicação processual e, na medida do possível, observar-se-ão os protocolos de consulta estabelecidos com o povo ou comunidade a ser citado, que sejam de conhecimento do juízo ou estejam disponíveis para consulta na rede mundial de computadores

§ 3º O CNJ e os tribunais desenvolverão manuais e treinamento dirigido aos magistrados e servidores, em especial aos oficiais de justiça, acerca da comunicação de atos processuais a comunidades e organizações indígenas, contemplando, inclusive, abordagens de Justiça Restaurativa. 

§ 4º Não será praticado ato de comunicação processual de indígena ou comunidade indígena, salvo para evitar o perecimento de direito, durante cultos religiosos, cerimônias ou rituais próprios de cada grupo

§ 5º Será possível o ingresso, a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição, de indígenas, suas comunidades ou organizações em processos em que esteja presente interesse indígena

§ 6º Aplica-se, no que couber, à intimação, o disposto neste artigo

(A imagem acima foi copiada do link IG.)  

RESOLUÇÃO Nº 454/2022 DO CNJ (II)

Hoje continuaremos a análise da Resolução nº 454/2022, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a qual estabelece diretrizes e procedimentos para efetivar a garantia do direito ao acesso ao Judiciário de pessoas e povos indígenas. Falaremos dos princípios que regem a referida Resolução, da atuação dos órgãos do Poder Judiciário para garantir o exercício dos direitos dos povos indígenas, bem como da chamada autoidentificação. Só lembrando que a Res. nº 454/2022 pode "cair" em provas de concursos públicos, na temática referente aos Direitos Humanos.


Art. 2º Esta Resolução é regida pelos seguintes princípios

I – autoidentificação dos povos

II – diálogo interétnico e intercultural

III – territorialidade indígena

IV – reconhecimento da organização social e das formas próprias de cada povo indígena para resolução de conflitos

V – vedação da aplicação do regime tutelar; e 

VI – autodeterminação dos povos indígenas, especialmente dos povos em isolamento voluntário

Art. 3º Para garantir o pleno exercício dos direitos dos povos indígenas, compete aos órgãos do Poder Judiciário

I – assegurar a autoidentificação em qualquer fase do processo judicial, esclarecendo sobre seu cabimento e suas consequências jurídicas, em linguagem clara e acessível

II – buscar a especificação do povo, do idioma falado e do conhecimento da língua portuguesa; 

III – registrar as informações decorrentes da autoidentificação em seus sistemas informatizados; 

IV – assegurar ao indígena que assim se identifique completa compreensão dos atos processuais, mediante a nomeação de intérprete, escolhido preferencialmente dentre os membros de sua comunidade

V – viabilizar, quando necessária, a realização de perícias antropológicas, as quais devem respeitar as peculiaridades do processo intercultural

VI – garantir a intervenção indígena nos processos que afetem seus direitos, bens ou interesses, em respeito à autonomia e à organização social do respectivo povo ou comunidade, promovendo a intimação do povo ou comunidade afetada para que manifeste eventual interesse de intervir na causa, observado o disposto no Capítulo II da presente Resolução;

VII – promover a intimação da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do Ministério Público Federal nas demandas envolvendo direitos de pessoas ou comunidades indígenas, assim como intimar a União, a depender da matéria, para que manifestem eventual interesse de intervirem na causa; e 

VIII – assegurar, quando necessária, a adequada assistência jurídica à pessoa ou comunidade indígena afetada, mediante a intimação da Defensoria Pública. 

Da autoidentificação 

Art. 4º Compreende-se como autoidentificação a percepção e a concepção que cada povo indígena tem de si mesmo, consubstanciando critério fundamental para determinação da identidade indígena

§ 1º Para efeitos desta Resolução, indígena é a pessoa que se identifica como pertencente a um povo indígena e é por ele reconhecido

§ 2º A autoidentificação do indivíduo como pertencente a determinado povo indígena não lhe retira a condição de titular dos direitos reconhecidos a todo e qualquer brasileiro ou, no caso de migrantes, dos direitos reconhecidos aos estrangeiros nessa condição que eventualmente estejam em território nacional

(A imagem acima foi copiada do link Oficina de Ideias 54.) 

terça-feira, 6 de fevereiro de 2024

"Duas coisas que me enchem a alma de crescente admiração e respeito: o céu estrelado sobre mim e a lei moral dentro de mim".


Immanuel Kant (1724 - 1804): antropólogo, bibliotecário, escritor, jusfilósofo, pedagogo, professor universitário, filósofo, físico e matemático nascido na extinta Prússia, região atualmente dividida entre Alemanha, Polônia e Rússia. Considerado um dos principais pensadores do iluminismo, seus sistemáticos e abrangentes trabalhos em epistemologia, ética, estética e metafísica, tornaram-no uma das figuras mais influentes de toda a filosofia ocidental moderna.

(A imagem acima foi copiada do link Oficina de Ideias 54.) 

domingo, 28 de janeiro de 2024

"Podemos julgar o coração de um homem pela forma como ele trata os animais".


Frase atribuída a Immanuel Kant (1724 - 1804): antropólogo, bibliotecário, escritor, jusfilósofo, pedagogo, professor universitário, filósofo, físico e matemático nascido na extinta Prússia, região atualmente dividida entre Alemanha, Polônia e Rússia. Considerado um dos principais pensadores do iluminismo, seus sistemáticos e abrangentes trabalhos em epistemologia, ética, estética e metafísica, tornaram-no uma das figuras mais influentes de toda a filosofia ocidental moderna.

(A imagem acima foi copiada do link Oficina de Ideias 54.) 

quarta-feira, 27 de setembro de 2023

SANTO AGOSTINHO - VIDA E OBRA (XIII)

O homem e a essência do pecado (I)


DEUS é a bondade absoluta e o homem é o réprobo miserável condenado à danação eterna e só recuperável mediante a graça divina. Eis o cerne da antropologia agostiniana. Para o bispo de Hipona, o homem é uma criatura privilegiada na ordem das coisas. Feito à semelhança de DEUS, desdobra-se em correspondência com as três pessoas da Trindade.

As expressões dessa correspondência encontram-se nas três faculdades da alma. A memória, enquanto persistência de imagens produzidas pela percepção sensível, corresponderia à essência (DEUS Pai), aquilo que é e nunca deixa de ser; a inteligência seria o correlato do verbo, razão ou verdade (Filho); finalmente, a vontade constituiria a expressão humana do amor (Espírito Santo), responsável pela criação do mundo.

De todas essas faculdades, a mais importante é a vontade, intervindo em todos os atos do espírito e constituindo o centro da personalidade humana. A vontade seria essencialmente criadora e livre, e nela tem raízes a possibilidade de o homem afastar-se de DEUS. Tal afastamento significa, porém, distanciar-se do ser e caminhar para o não-ser, isto é, aproximar-se do mal. Reside aqui a essência do pecado, que de maneira alguma é necessário e cujo único responsável seria o próprio livre-arbítrio da vontade humana. 

O pecado é, segundo Agostinho, uma transgressão da lei divina, na medida em que a alma foi criada por DEUS para reger o corpo, e o homem, fazendo mau uso do livre-arbítrio, inverte essa relação, subordinando a alma ao corpo e caindo na concupiscência e na ignorância. Voltada para a matéria, a alma acaba por secar-se pelo contato com o sensível, dando a ele o pouco de substância que lhe resta, esvaindo-se no não-ser e considerando-se a si mesma como um corpo.  

No estado de decadência em que se encontra, a alma não pode salvar-se por suas próprias forças. A queda do homem é de inteira responsabilidade do livre-arbítrio humano, mas este não é suficiente para fazê-lo retornar às origens divinas. A salvação não é apenas uma questão de querer, mas de poder. E esse poder é privilégio de DEUS. Chega-se, assim, à doutrina da predestinação e da graça, uma das pedras de toque do agostinismo.

A graça é necessária para que o homem possa lutar eficazmente contra as tentações da concupiscência. Sem ela o livre-arbítrio pode distinguir o certo do errado, mas não pode tornar o bem um fato concreto. A graça precede todos os esforços de salvação e é seu instrumento necessário. Ajunta-se ao livre-arbítrio sem, entretanto, negá-lo; é um fator de correção e não o aniquila. Sem o auxílio da graça, o livre-arbítrio elegeria o mal; com ela, dirige-se para o bem eterno. 

Mas, segundo Agostinho, nem todos os homens recebem a graça das mãos de DEUS; apenas alguns eleitos, que estão, portanto, predestinados à salvação. A propósito da graça, Agostinho polemizou durante anos com o monge Pelágio (c. 360-c. 420) e seus seguidores. Os pelagianistas insistiam no esforço que o homem deve despender para obter a salvação e encareciam a eficácia do livre-arbítrio. Com isso minimizavam a intervenção da graça, quando não chegavam a negá-la totalmente.

A experiência pessoal de Agostinho, no entanto, atestava vigorosamente contra a tese de Pelágio e por causa disso reagiu decidida e, às vezes, violentamente. A controvérsia jamais foi totalmente solucionada e os teólogos posteriores dividiram-se em torno da questão. Calvino (1509-1564), por exemplo, levou as teses agostinianas às últimas consequências: depois do pecado original, o homem está totalmente corrompido pela concupiscência e depende exclusiva e absolutamente da vontade divina a concessão da graça para a salvação. Outros aproximaram-se de Pelágio, tentando restaurar o primado do livre-arbítrio e das ações humanas como fonte de salvação.

Fonte: Santo Agostinho. Coleção Os Pensadores. 4 ed. São Paulo: Nova Cultural, 1987, XVIII.

(A imagem acima foi copiada do link Oficina de Ideias 54.) 

quarta-feira, 3 de agosto de 2022

ESCOLA PERIPATÉTICA: DOUTRINAS PRINCIPAIS

Alimente sua curiosidade e aumente seus conhecimentos.


A visão filosófica de Aristóteles (384 a.C. - 322 a.C.) tem como característica o esforço em captar a realidade de modo unitário (contra o dualismo de Platão) e, ao mesmo tempo, a tentativa de restituir as causas últimas de tudo aquilo que é mutável e contingente a um princípio único transcendente. 

Com tal propósito, o filósofo postula quatro causas fundamentais: 

a matéria e a forma, para explicar a estrutura intrínseca das realidade corpóreas); 

o agente e a finalidade, para explicar a origem das coisas e seu dinamismo.  

Apoia-se nesses princípios para resolver todos os grande problemas:  

Problema cosmológico: composição hilemórfica de todas as coisas, ou seja, todas elas são constituídas de matéria e forma, as quais se encontram na relação de potência e ato; teologia: o dinamismo das coisas e o seu devir são provocados pelo primeiro Motor Imóvel, o que é seu fim último.  

Problema antropológico: o homem não é apenas alma, como afirmava Platão, mas é o resultado da união substancial de alma e corpo, a primeira concebida como forma e o segundo como matéria; entretanto, a alma compreende um elemento espiritual, divino e imortal.

Fonte: Wikipédia.

(A imagem acima foi copiada do link Audible.) 

domingo, 26 de julho de 2020

"Ninguém pode ser completamente livre até que todos o sejam".

Herbert Spencer

Herbert Spencer (1820 - 1903): antropólogo, biólogo e filósofo inglês. Representante do chamado Liberalismo Clássico, foi um profundo admirador da obra do naturalista Charles Darwin e teve grande influência no pensamento de Émile Durkheim. Considerado o fundador do chamado darwinismo social, é de Spencer - e não de Darwin! - a expressão "sobrevivência do mais apto".


(A imagem acima foi copiada do link e-Biografia.)

quarta-feira, 20 de maio de 2020

ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - FAMÍLIA SUBSTITUTA

Mais dicas para cidadãos e concurseiros de plantão, apontamentos retirados dos arts. 28 e seguintes, da Lei nº 8.069/1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)

Em oito meses, pelo menos 16 crianças indígenas morreram no Alto ...
Criança ou adolescente indígena ou remanescente de comunidade quilombola: devem ter respeitados e considerados sua identidade social e cultural, bem como seus costumes e tradições.

Antes de adentrarmos no assunto de hoje, convém deixar registrado que o Conselho Nacional de Justiça - CNJ, através da Resolução nº 54/2008, dispõe sobre a implantação e funcionamento do Cadastro Nacional de Adoção.

Vamos lá...

A colocação em família substituta será feita mediante guarda, tutela ou adoção, independentemente da situação jurídica da criança ou adolescente, nos termos do ECA.

Sempre que for possível, a criança ou o adolescente será previamente ouvido por equipe interdisciplinar, respeitado seu estágio de desenvolvimento e grau de compreensão a respeito das implicações da medida, e terá sua opinião devidamente considerada.

Quando se tratar de maior de 12 (doze) anos de idade, será necessário seu consentimento, colhido em audiência.

Na apreciação do pedido se levará em conta o grau de parentesco e a relação de afinidade ou de afetividade, com o propósito de evitar ou minorar as consequências decorrentes da medida.

Os grupos de irmãos serão colocados sob adoção, tutela ou guarda da mesma família substituta, exceto se houver a comprovada existência de risco de abuso ou outra situação que justifique plenamente a excepcionalidade de solução diversa, buscando-se, em qualquer caso, evitar o rompimento definitivo dos vínculos fraternais.

A colocação da criança ou do adolescente em família substituta será precedida de sua preparação gradativa e acompanhamento posterior, realizados pela equipe interprofissional a serviço da Justiça da Infância e da Juventude, preferencialmente com o apoio dos técnicos responsáveis pela execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar.

A colocação em família substituta não admitirá transferência da criança ou do adolescente a terceiros ou a entidades - governamentais ou não governamentais - sem prévia autorização judicial. 

Não se deferirá colocação em família substituta a pessoa que revele, por qualquer  modo, incompatibilidade com a natureza da media, ou, ainda, que não proporcione um ambiente familiar adequado.

Tratando-se de criança ou adolescente indígena ou proveniente de comunidade remanescente de quilombo, é obrigatório ainda:

I - que sejam consideradas e respeitadas sua identidade social e cultural, os seus costumes e tradições, bem como suas instituições, contanto que não sejam incompatíveis com os direitos fundamentais reconhecidos pelo próprio ECA e pela Constituição Federal;

II - que a colocação familiar aconteça prioritariamente no seio de sua comunidade ou junto a membros da mesma etnia; e,

III - a intervenção e oitiva de representantes do órgão federal responsável pela política indigenista, quando se tratar de crianças e adolescentes indígenas, e de antropólogos, perante a equipe interprofissional ou multidisciplinar que irá acompanhar o caso.

Importante: A colocação em família substituta estrangeira constitui medida excepcional, admissível somente na modalidade de adoção.

Finalmente, cabe frisar que ao assumir a guarda ou a tutela, o responsável prestará compromisso de bem e fielmente desempenhar o encargo, mediante termo nos autos.
  
Fonte: BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8.069, de 13 de Julho de 1990.

(A imagem acima foi copiada do link Juruá em Tempo.)

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

"A fé não é básica apenas em assuntos religiosos".

Câmara Cascudo

Luís da Câmara Cascudo (1898 - 1986): advogado, antropólogo, autor, historiador, jornalista e professor brasileiro. Nascido em Natal, Rio Grande do Norte, Câmara Cascudo dedicou-se ao estudo da cultura brasileira, deixando vasta obra, como o Dicionário de Folclore Brasileiro (1952). É considerado pelos especialistas como o maior folclorista brasileiro de todos os tempos. 


(A imagem acima foi copiada do link Ebiografia.)

terça-feira, 12 de novembro de 2019

"O sábio não é o homem que fornece as verdadeiras respostas; é quem faz as verdadeiras perguntas".

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Claude Lévi-Strauss (1908 - 2009): antropólogo, professor e filósofo belga. Um dos grandes intelectuais do século XX, também é considerado o fundador da antropologia estruturalista. A obra de Strauss é reconhecida internacionalmente, ele, inclusive, fez trabalhos em campo com índios do Brasil Central, entre 1935 e 1939.  


(A imagem acima foi copiada do link Revista Cult.)

segunda-feira, 8 de janeiro de 2018



"Existe uma civilização mundial, saída da civilização ocidental, que desenvolve o jogo interativo da ciência, da técnica, da indústria e do capitalismo e que comporta um certo número de valores padronizados. Ao mesmo tempo em que compartilha múltiplas culturas em seu seio, uma sociedade também gera uma cultura própria".

Edgar Morin (1921 - ): antropólogo, filósofo e sociólogo francês de origem judaica. Formado em Direito, História e Geografia, é considerado um dos principais pensadores da contemporaneidade.


(A imagem acima foi copiada do link Revista Prova Verso e Arte.)

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

DIREITO CIVIL

Aumente seus conhecimentos

Direito Civil: regula as relações entre particulares.

As relações humanas na contemporaneidade apresentam um elevado grau de complexidade nunca antes visto na história da humanidade. Para regular tais relações, tão díspares e às vezes convergentes, faz-se necessário um conjunto de normas que consiga, ao mesmo tempo, disciplinar cada aspecto da sociedade, mas respeitando as especificidades de cada indivíduo.

Surgiu, assim, o direito civil, um ramo do direito que muitas vezes  produz certa ambiguidade por apresentar uma polissemia de significados. De uma forma bastante resumida podemos dizer que o direito civil é o direito comum, não abrangendo aspectos de âmbito criminal, administrativo, penal ou militar. É o direito das pessoas e das relações jurídicas de natureza privada.

E o que seriam estas relações jurídicas de natureza privada... É aqui que o direito civil mostra sua abrangência e complexidade. Ele regula a ordem jurídica da sociedade civil, qual seja, o universo social no qual são construídas as relações familiares e econômicas.

Na sua esfera de atuação ele protege as relações humanas pertinentes a direitos patrimoniais, atividade econômica, prestação de serviços, proteção da família e da pessoa humana, e responsabilidade civil (indenização por dano causado a terceiros).

Para entendermos o direito civil faz-se necessário conhecer o período histórico e as transformações pelas quais a sociedade vem passando. Por não ser estático, ele deve acompanhar tais mudanças, sob pena de se tornar obsoleto. Assim, para compreendermos o fenômeno jurídico deste ramo do direito devemos articulá-lo com outras áreas do conhecimento humano como a antropologia, a economia, a história, a sociologia.


(A imagem acima foi copiada do link Google Images.)

sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

EICHMANN EM JERUSALÉM (III)

Parte final do livro Eichmann em Jerusalém - Um Relato Sobre a Banalidade do Mal, de Hannah Arendt. Trabalho apresentado como avaliação final da disciplina Sociologia e Antropologia, do curso de Direito Bacharelado, turma 2016.2, da UFRN.

Serviço secreto israelense: os caras capturaram Eichmann na Argentina, levaram escondido para Israel, não dispararam um tiro, nem chamaram a atenção das autoridades argentinas... Eles são foda!!!

XV

JULGAMENTO, APELAÇÃO E EXECUÇÃO

No capítulo final do livro, Hannah Arendt narra uma verdadeira epopeia de Eichmann para fugir do seu destino. Inicialmente ele teria se encontrado com Himmler, em abril de 1945, e combinado seqüestrar de cem a duzentos judeus importantes para usá-los como moeda de troca com o comandante norte-americano Eisenhover.

Capturado por soldados estadunidenses, foi levado para um campo de prisioneiros onde, mesmo após numerosos interrogatórios, manteve em segredo sua verdadeira identidade. Eichmann escapou do campo e trabalhou como lenhador próximo à cidade de Hamburgo. Depois atravessou a Áustria, chegou na Itália e de lá, com a ajuda de um padre franciscano, conseguiu um passaporte falso de refugiado e escapou para a Argentina, com o nome de Richard Klement. A mulher e os filhos foram depois.

Eichmann foi levado a Israel numa espetacular ação do Serviço Secreto israelense, que o tirou de Buenos Aires sem disparar sequer um único tiro. Esse episódio foi utilizado com ênfase pelo advogado de defesa. O dr. Servatiu destacou que seu cliente havia sido trazido a Israel a contragosto.

Em sua defesa, Eichmann insistiu veementemente que ele próprio nunca havia cometido nenhum ato aberto. Apenas cumpria ordens e que era culpado apenas de “ajudar e instigar” a realização dos crimes dos quais estava sendo acusado. Disse também ser vítima de uma falácia.

A Corte pronunciou sua sentença de morte às nove horas da manhã do dia 15 de dezembro de 1961. Em 22 de março de 1962 começaram os trabalhos de revisão perante a Corte de Apelação, a Suprema Corte de Israel. Em 29 de maio de 1962 saiu o segundo julgamento. A Suprema Corte aceitou os argumentos da acusação.

Vários pedidos de clemência foram encaminhados a Itzhak Bem-Zvi, presidente de Israel. Os pedidos chegavam através de centenas de cartas e telegramas do mundo inteiro, inclusive de judeus. O próprio Eichmann fez uma carta de próprio punho com quatro páginas, mas o presidente negou todos.

Em 31 de maio de 1962 Eichmann foi enforcado. Seu corpo cremado e as cinzas jogadas no mar Mediterrâneo, longe das águas israelenses. 


(A imagem acima foi copiada do link Images Google.)

quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

EICHMANN EM JERUSALÉM (II)

Continuação de trechos do livro Eichmann em Jerusalém - Um Relato Sobre a Banalidade do Mal, escrito pela filósofa judia Hannah Arendto qual apresentei como trabalho final da disciplina de Sociologia e Antropologia, da turma 2016.2, do curso de Direito Bacharelado da UFRN. Excelente livro. Recomendo.

Judeus prisioneiros em campo de concentração: ninguém parecia querer ajudá-los...

XIV

PROVAS TESTEMUNHAIS

Neste capítulo Hannah Arendt inicia falando da tentativa da burocracia da SS em destruir e falsificar documentos no intuito de esconder os anos de assassinato sistemático dos judeus. A destruição de documentos ocorreu durante as últimas semanas da guerra, numa clara tentativa de desespero dos nazistas.

O departamento que Eichmann chefiava queimou todos os arquivos, contudo, isso de nada adiantou muito, uma vez que parte da correspondência havia sido endereçada para outros departamentos do Estado. Esses arquivos foram recuperados pelos Aliados, e constituíram-se em provas mais que suficientes para contar ao mundo as atrocidades da Solução Final.

Apesar de ser judia e de ter fugido da Europa por conta da perseguição nazista, a autora se mostra imparcial, ao relatar as dificuldades que o dr. Servatiu, advogado de Adolf Eichmann enfrentou para defender seu cliente. Ela cita, por exemplo, a pequena quantidade de documentos juntados pelo dr. Servatiu – 110 –, enquanto os acusadores apresentaram cerca de 500.

Ela também chega até a criticar o processo de julgamento, ao afirmar que Israel era a única nação do mundo em que certas testemunhas de acusação não podiam ser interrogadas pela defesa, e que as testemunhas de defesa não podiam ser ouvidas.

Para ela, o defensor de Eichmann não teve nem os meios, nem o tempo, nem os arquivos do mundo e os instrumentos do governo à sua disposição para montar uma boa estratégia de defesa. Segundo a autora, a principal limitação deste julgamento – como acontecera à defesa dos nazistas em Nuremberg –, seria a falta de assistentes para pesquisarem uma quantidade enorme de documentos e encontrar qualquer coisa que pudesse servir de base para inocentar o acusado.       

Mas a prova mais importante do caso foi, sem sombra de dúvidas, o testemunho à Corte do próprio Eichmann, que apesar da forte pressão sobre seus ombros, era usualmente bastante calmo. Testemunharam, ainda, perante o tribunal cidadãos de Israel, selecionados entre milhares de voluntários e testemunhas dos seguintes lugares: Alemanha, Áustria, Praga, França, Holanda, Dinamarca, Noruega, Luxemburgo, Itália, Grécia, Rússia Soviética, Iugoslávia, Romênia, Eslováquia, Hungria, Polônia e Lituânia. 

Quando perguntados se alguém havia recebido ajuda, a maioria das testemunhas respondia que toda a população parecia estar contra os judeus. “Dava para contar nos dedos de uma mão os judeus escondidos por famílias cristãs”.


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quarta-feira, 30 de novembro de 2016

EICHMANN EM JERUSALÉM (I)

Para aqueles que querem aprender um pouco mais...

Eichmann em Jerusalém - Um Relato Sobre a Banalidade do Mal é um livro escrito pela filósofa judia Hannah Arendt. A obra, publicada em 1963, foi a união de diversos artigos da filósofa que fez a cobertura do julgamento do nazista Adolf Eichmann para a revista The New Yorker. Vale a pena conferir.

Mas se você não achar o livro, ou se não encontrar tempo para ler, vou dar uma mãozinha, seu preguiçoso! A seguir, alguns textos dessa obra fantástica, que apresentei como trabalho final da disciplina de Sociologia e Antropologia, da turma 2016.2, do curso de Direito Bacharelado da UFRN: 

XIII

OS CENTROS DE EXTERMÍNIO NO LESTE

Neste capítulo a autora Hannah Arendt fala das atrocidades cometidas pelos nazistas numa vasta área da Europa, que incluía a Polônia, o território soviético ocupado pelos alemães e os Estados Bálticos. Esses foram os primeiros países sobre os quais foram apresentados testemunhos de acusação no julgamento de Adolf Eichmann, em Jerusalém.

Segundo a autora, o Leste foi o cenário central do sofrimento judeu. Ela o descreve como o lugar de onde não havia escapatória, uma vez que o número de sobreviventes não passava de 5%. A acusação usou esse argumento contra o acusado, pois dava uma ideia da dimensão do genocídio praticado, não só contra o povo judeu, mas contra todos que os nazistas consideravam como raças inferiores.

Mas o dr. Servatiu, advogado de defesa de Eichmann tentou desmerecer os acusadores apresentando os seguintes argumentos:

a)    as provas ligando o acusado às atrocidades cometidas no Leste Europeu eram escassas, uma vez que os arquivos sobre a seção de Eichmann tinham sido destruídos pelos nazistas;
b)    os argumentos das testemunhas que teriam visto o acusado com seus próprios olhos caía por terra, uma vez que Eichmann era um funcionário burocrático, nunca tendo sequer pisado na maioria dos locais de extermínio;  
c)    por ser em Israel, grande parte dos juízes eram judeus, o que provocaria um veredicto parcial no julgamento de alguém acusado de ter contribuído com o holocausto; e,
d)    Eichmann cumpria ordens e nunca chegou a assassinar ninguém, só era o responsável em fazer os trens que levavam os judeus partirem na hora certa.      
Todos esses argumentos foram contraditados pela acusação. Para os acusadores, Eichmann era seu próprio chefe, podendo, portanto, ser diretamente responsabilizado por tudo o que acontecia sob sua jurisdição. E mais, ele já sabia, evidentemente, que a esmagadora maioria das pessoas que embarcaram naqueles trens jamais voltaria com via. Mesmo sabendo disso, ele não fez nada para impedir.



(A imagem acima foi copiada do link Wook.)

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

A CONSCIÊNCIA CONSERVADORA NO BRASIL

Breve resumo do livro A Consciência Conservadora no Brasil, de Paulo Mercadante (MERCADANTE, Paulo. A Consciência Conservadora no Brasil. 2. ed. São Paulo: Civilização Brasileira, 1972.). Excelente para alunos universitários e para aqueles que querem aumentar seus conhecimentos sobre a história e a cultura brasileiras.

Colonizadores portugueses: há quem defenda que herdamos deles uma mentalidade conservadora.

Fomos colonizados por europeus e nossas raízes culturais apresentam traços marcantes dessa influência. Uma das características desse processo civilizatório é a consciência conservadora que nossa sociedade desenvolveu ao longo dos séculos, mas que muitas vezes é camuflada pelo mito do “brasileiro cordial”.

Ora, a tentativa de disfarçar nosso espírito conservador é descrito pelo autor como uma saída que as elites encontraram para conciliar os vários interesses envolvidos no processo de formação do Brasil – sabido por todos – um país de dimensões continentais.

Na obra A Consciência Conservadora no Brasil, Paulo Mercadante nos leva a um passeio pela nossa história – começando antes mesmo do descobrimento, analisando a cultura europeia – e explica com riqueza de detalhes e argumentos porque a sociedade brasileira apresenta-se da forma como está hoje: com elevada disparidade social e com um exacerbado sentimento conservador, disfarçado por um discurso conciliatório.

Embora a segunda edição do livro tenha sido lançada há mais de quatro décadas, quando nosso país passava por um regime de exceção, as palavras de Mercadante parecem atuais, como se fizessem uma profecia do tumultuado momento político que estamos vivendo:

[...] O Brasil vive um período de sincretismo avassalador. Queima as potencialidades etnográficas, em busca de um destino, de um valor que nunca poderá ser estranho ao sentido de sua sociedade, de suas tradições de liberdade, de seu passado. [...] Aliado ao ressentimento da classe média, a radicalização poderia alcançar um programa totalitário. Se aceitássemos a possibilidade, estaríamos admitindo o predomínio de uma ideologia sobre peculiaridades nacionais, o que não parece possível em face da realidade de nossos dias. Por outro lado, apoiado na classe média, nunca seria capaz o grupo vitorioso de definir-se a favor de um totalitarismo sem um sentimento de desespero (MERCADANTE, 1972, p. 8).     

Como dito anteriormente, fomos colonizados por europeus. Nossos “descobridores”, os portugueses, possuíam uma ideologia senhorial, a qual imprimiu fortemente seus traços na colonização do Brasil. O modelo de colônia implantado por aqui foi o de exploração, primeiro com o pau-brasil, depois com a cana-de-açúcar, concomitantemente, com as minas de ouro e diamante.

Apesar de serem atividades econômicas distintas – tanto geograficamente, quanto cronologicamente – esses sistemas possuíam algumas características em comum: patriarcal, escravagista, estamental (não permitia a mobilidade social). Isso acabou se refletindo negativamente ao longo da formação da nossa identidade como nação.

Crescemos sob o comando de grupos que não tinham interesse algum no desenvolvimento do país, seja sob o ponto de vista econômico, seja sob o ponto de vista cultural. Para eles, o mais importante era a situação permanecer como estava.

Para complicar mais ainda nosso quadro social, havia a atuação da Igreja, que era uma força poderosa na época, dominando a instrução e todas as manifestações culturais da colônia. E quem se opunha ia para a fogueira.

Diferentemente ao que aconteceu no Brasil, as colônias da América do Norte, que vieram a se tornar os Estados Unidos de hoje, passaram por uma colonização de povoamento. Lá, era livre a circulação tanto de mercadorias, quanto de ideias. Como consequencia, houve um desenvolvimento econômico, tecnológico e social mais acentuado que o nosso.

Muitos achavam que a tradição conservadora na colônia terminaria se o Brasil rompesse de vez com Portugal e proclamasse sua independência. Ledo engano. Com a “independência” do jugo português e a conseqüente instauração da monarquia, o quadro social não mudou.

Com o medo de que nosso território se dividisse em vários países, as diversas elites regionais fizeram uma espécie de conciliação e centralizaram todo o poder na figura do Imperador. Nessa parte do livro, Paulo Mercadante deixa transparecer que esse discurso conciliatório, visto como uma qualidade genuinamente brasileira, pode esconder uma semente de conservadorismo:

De forma sobremodo conciliatória fora o movimento entre os ultramarinos. Transigia o elemento mais avançado, radical e republicano, com o elemento reacionário, em geral alimentado de pré-juízos contra o espírito democrático. Do conflito, que vinha de longe, emanaria o meio-termo, encarnado numa força de centro, moderadora quase sempre, porém atuante. Constituíra-se principalmente de antigos radicais, revolucionários de lojas maçônicas, os quais se deixaram influenciar pela ideologia da restauração, e pela tendência de centro, moderada e oportunista (MERCADANTE, 1972, p. 51).

O autor, contudo, não chega a apontar em sua obra uma saída para uma eventual quebra de paradigma no que concerne à tradição de conservadorismo no nosso país. Uma saída, quem sabe, seria a chegada ao poder de um grupo com ideias progressistas, liberais, e que não fizesse parte das elites que dominam o Brasil desde a época da colonização.  

Pode parecer utopia, mas isso chegou a acontecer na nossa história recente. Um membro da classe operária conseguiu ocupar o cargo mais alto do país e começou a colocar em prática uma série de programas que estavam ocasionando mudanças radicais na nossa estrutura social. 

Entretanto, enquanto seu projeto ainda engatinhava, os mesmos grupos que há cinco séculos controlam o país uniram-se para retomar o poder e manter a situação como sempre foi: patriarcal, estamental e conservadora.


(A imagem acima foi copiada do link Google Images.)