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segunda-feira, 26 de agosto de 2024

PROVAS EMPRESTADAS E PROVAS ILÍCITAS - JÁ CAIU EM PROVA

(FGV - 2024 - PC-SC - Psicólogo Policial Civil) Em processo administrativo, o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) condenou determinada empresa por formação de cartel, se valendo de interceptações telefônicas emprestadas do processo penal, as quais foram consideradas ilícitas e declaradas nulas pelo Poder Judiciário. 

Diante do exposto, é correto afirmar que 

A) a condenação do CADE é válida, pois são admissíveis, em qualquer âmbito ou instância decisória, as provas declaradas ilícitas pelo Poder Judiciário. 

B) a condenação do CADE não é válida, pois são inadmissíveis, em processos administrativos desta natureza, as provas emprestadas do processo penal, ainda que consideradas lícitas. 

C) a condenação do CADE é válida, pois são admissíveis, em processos administrativos desta natureza, as provas declaradas ilícitas pelo Poder Judiciário.

D) a condenação do CADE não é válida, pois são inadmissíveis, em qualquer âmbito ou instância decisória, as provas declaradas ilícitas pelo Poder Judiciário. 

E) a condenação do CADE é válida, em razão da impossibilidade de contaminação da prova que fundamentou a decisão administrativa, considerando haver separação entre os processos penal e administrativo. 


Gabarito: assertiva D. De fato, em que pese ser possível aproveitar as provas de um processo em outro (provas emprestadas), as provas declaradas ilícitas pelo Poder Judiciário não podem ser utilizadas, valoradas ou aproveitadas em processos administrativos de qualquer espécie. 

Na verdade, a questão em epígrafe reproduziu o seguinte caso concreto: o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), em processo administrativo, condenou uma empresa pela prática de cartel - condenação esta baseada em provas obtidas a partir de interceptação telefônica decretada em investigação criminal. 

Acontece que a referida interceptação foi declarada ilegal, porque autorizada unicamente com base em denúncia anônima. Logo, o processo administrativo também deve ser declarado nulo porque fundamentado em prova ilícita. (STF. Plenário. ARE 1316369/DF, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 9/12/2022. Repercussão Geral – Tema 1238. Info 1079).

Como dito acima, é perfeitamente possível usar prova emprestada em processo administrativo disciplinar, conforme entendimento já pacificado e sumulado do Superior Tribunal de Justiça (STJ):

Súmula n° 591: É permitida a "prova emprestada" no processo administrativo disciplinar, desde que devidamente autorizada pelo juízo competente, respeitados o contraditório e a ampla defesa.

Além disso, como já estudado anteriormente aqui no blog Oficina de Ideias 54, nosso ordenamento jurídico proíbe tanto as provas ilícitas quanto as provas obtidas através de meios ilícitos, bem como as provas derivadas de ambas. É o que ensinam nossa Constituição Federal e o Código de Processo Penal - CPP (Decreto-Lei nº 3.689/1941):

CF/1988: Art. 5° [...] LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos;

CPP: Art. 157.  São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais

Cumpre destacar que, mesmo que a prova propriamente dita cumpra os requisitos legais, ela é inválida caso se origine de uma prova ilícita. É a chamada Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada (fruits of the poisonous tree), surgida no direito norte-americano. 

Todavia, quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou se as provas derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das provas ilícitas, então podem ser admitidas: 

CPP: Art. 157. [...] § 1º  São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras

§ 2º  Considera-se fonte independente aquela que por si só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova.

(A imagem acima foi copiada do link Oficina de Ideias 54.) 

quinta-feira, 29 de novembro de 2018

DROGAS: LEGALIZAR OU NÃO LEGALIZAR, EIS A QUESTÃO (II)

Fragmento de artigo apresentado na disciplina Direito Penal IV, do curso Direito Bacharelado (noturno), da UFRN, semestre 2018.2

Guerra às drogas: ineficaz tanto no discurso quanto na prática...
1- INTRODUÇÃO:
A experiência de combate às drogas ilícitas, no Brasil e no mundo, tem se apoiado, em regra, no enfrentamento direto, consubstanciado no uso da força bruta e da violência. O uso de armamento pesado é comum, tanto do lado do aparelho estatal, quanto dos comerciantes de tóxicos (narcotraficantes). 
No meio desse verdadeiro fogo cruzado tem-se montado um cenário de guerra não declarada. Há ‘baixas’ dos dois lados, mas o maior número de vítimas, infelizmente, é da população inocente. A sociedade, como um todo, acaba arcando com os custos (financeiros, sociais) dessa carnificina que só cresce a cada dia que passa.
Qual a saída, então? Legalizar o uso de tóxicos? Endurecer, ainda mais o combate aos narcotraficantes? A resposta a esse questionamento não é tão simples. A complexidade se dá, principalmente, porque temos defensores para as duas saídas.
Ora, há quem diga que endurecer a guerra contra os ‘narcos’, dá resultados. Nações como a Colômbia fizeram isso, com a introdução de armamentos sofisticados, treinamento especializado e ajuda norte-americana. Aparentemente conseguiu vencer os poderosos cartéis (Medellín e Cali) que controlavam aquele país.
Lá, parece que o enfrentamento direto surtiu efeito. Os atentados a bomba, assassinatos de policiais e juízes, sequestros de pessoas influentes e as chacinas frequentes desapareceram. Com a pacificação social, a Colômbia cresceu economicamente, atraiu investidores e hoje, não é nem sombra da terra dos cartéis, como fora em meados dos anos 1970, toda a década de 1980 e início dos anos 1990.    
O enfrentamento direto, entretanto, parece não estar surtindo o efeito desejado como no México, por exemplo. Lá, os cartéis – como o de Sinaloa – ainda têm grande preponderância no cenário nacional, representando um poder paralelo, verdadeiro Estado dentro do Estado.
Os adeptos da teoria de que a legalização de alguns tipos de drogas talvez seja a solução para a escalada da violência em nosso país sempre usam como exemplos as experiências vividas na Holanda e no Uruguai.
Ora, antes de fazermos qualquer comparação com as duas nações acima elencadas, devemos compreender que são países com realidades e culturas totalmente diferentes da brasileira. O fato de a experiência da legalização do uso recreativo de determinada droga ter obtido êxito em um país, não quer dizer necessariamente que vai dar certo aqui também.  
Holanda e Uruguai sempre são citados – pelos defensores da descriminalização do uso de algumas drogas – como exemplos de que a saída para o fim da criminalidade provocada pelo tráfico de drogas ilícitas é a legalização. Alegam, tais defensores, que o índice de violência e criminalidade nestes dois países caíram vertiginosamente, após os respectivos governos adotarem uma política, digamos mais branda, com relação às drogas ilícitas.  
Mas a realidade está mostrando que a situação não é tão pacífica quanto estão querendo fazer transparecer. 

(A imagem acima foi copiada do link Red Dit.)
Bibliografia: 
A Holanda reconhece: legalizar maconha foi erro. Disponível em:  <https://adeilsonfilosofo.jusbrasil.com.br/noticias/239200069/a-holandareconhece-legalizar-maconha-foi-erro>. Acesso em 09/11/2018; 
Amsterdão. Disponível em:<https://pt.wikipedia.org/wiki/Amesterd%C3%A3o>. Acesso em 07/11/2018;  
BRASIL. Lei n° 11.343, de 23 de agosto de 2006. Lei de Drogas. Brasília, 23 ago. 2006. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato20042006/2006/lei/l11343.htm>. Acesso em 25/08/2018;  
Cartel                      de                     Sinaloa.                     Disponível                      em:<https://pt.wikipedia.org/wiki/Cartel_de_Sinaloa>. Acesso em 01/09/2018; 
Debate: descriminalizar as drogas ajuda no combate à criminalidade? Disponível em: <http://www.oabsp.org.br/noticias/2017/03/debate-descriminalizar-as-drogas-ajudano-combate-a-criminalidade.11585>. Acesso em 01/11/2018; 
Drogas e Violência: a realidade nos países que legalizaram.Disponível em: <http://www.vermelho.org.br/noticia/270659-1>. Acesso em 06/11/2018; 
Legalização da maconha não diminuiu tráfico no Uruguai.Disponível em: <https://g1.globo.com/mundo/noticia/legalizacao-da-maconha-nao-diminuiutrafico-no-uruguai.ghtml>Acesso em 03/10/2018; 
Narcos. Temporadas 1, 2 e 3. Seriado disponível na Netflix; 
Por que o sindicato da polícia da Holanda afirma que o país está virando um 'narcoestado'? Disponível em
<https://www.bbc.com/portuguese/internacional-43247861>            Acesso          em 07/11/2018; 
Quatorze anos após descriminalizar todas as drogas, é assim que
Portugal              está             no              momento.              Disponível              em:
SANTOS JÚNIOR, Rosivaldo Toscano dos. A Guerra ao Crime e os Crimes da Guerra: uma crítica descolonial às políticas beligerantes no sistema de justiça criminal brasileiro. 1ª Ed. – Florianópolis: Empório do Direito, 2016. 460 p.;
Tropa de Elite. Filme disponível na Netflix.