domingo, 10 de setembro de 2023

SANTO AGOSTINHO - VIDA E OBRA (VII)

Fé e razão: a busca da felicidade


À síntese que realizou, ele mesmo deu a denominação de "filosofia cristã". O núcleo em torno do qual gravitam todas as suas ideias é o conceito de beatitude. O problema da felicidade constitui, para Agostinho, toda a motivação do pensar filosófico. Uma das últimas obras que redigiu, a Cidade de Deus, afirma que "o homem não tem razão para filosofar, exceto para atingir a felicidade"

A tese é defendida valendo-se de um manual de Marcus Terentius Varro (116-27 a.C.), onde se encontram definidas 288 diferentes teorias filosóficas, reais e possíveis, tendo todas em comum a mesma questão: como obter a felicidade? A filosofia é, assim, entendida não como disciplina teórica que coloca problemas à estrutura do universo físico ou à natureza dos deuses, mas como uma indagação sobre a condição humana à procura da beatitude.

A beatitude, no entanto, não foi encontrada por Agostinho nos filósofos que conhecera na juventude, mas nas Sagradas Escrituras, quando iluminado pelas palavras de Paulo de Tarso. Não foi fruto de procedimento intelectual, mas ato de intuição e de fé.

Impunha-se, portanto, conciliar as duas ordens de coisas e com isso Agostinho retorna à questão principal da Patrística, ou seja, ao problema das relações entre a razão e a fé, entre o que se sabe pela convicção interior e o que se demonstra racionalmente, entre a verdade revelada e a verdade lógica, entre a religiosidade cristã e a filosofia pagã.

Desde a conversão, Agostinho se propôs a atingir, pela fé nas Escrituras, o entendimento daquilo que elas ensinam, colocando a fé como a via de acesso à verdade eterna. Mas, por outro lado, sustentou que a fé é precedida de certo trabalho da razão. Ainda que as verdades da fé não sejam demonstráveis, isto é, passíveis de prova, é possível demonstrar o acerto de se crer nelas, e essa tarefa cabe à razão.

A razão relaciona-se, portanto, duplamente com a fé: precede-a e é sua consequência. É necessário compreender para crer e crer para compreender ("Intellige ut credas, crede ut inteligas").

Mesmo que essa tese não tenha maior rigor filosófico e soe mais como fórmula retórica do que como argumentação lógica, teve grande força, pois era um claro resultado da história pessoal de Agostinho. Antes da conversão ele andara inquieto pelos caminhos das elaborações racionais dos maniqueus, do ecletismo ciceroniano e do neoplatonismo de Plotino. Todos, especialmente o último, prepararam a explosão mística de iluminação pela fé. Depois desta, utilizou tudo o que sua cultura filosófica lhe fornecia, no sentido de racionalizar os dogmas cristãos.

A filosofia é, para Agostinho, apenas um instrumental auxiliar destinado a um fim que transcende seus próprios limites. Por isso muitos veem nele um teólogo e um místico e não propriamente um filósofo. Todavia, seu pensamento manifesta frequentemente grande penetração filosófica na análise de alguns problemas particulares e a verdade é que Agostinho conseguiu sistematizar uma grandiosa concepção do mundo, do homem e de DEUS, que se tornou, por muito tempo, a doutrina fundamental da Igreja Católica.

Fonte: Santo Agostinho. Coleção Os Pensadores. 4 ed. São Paulo: Nova Cultural, 1987.

(A imagem acima foi copiada do link Minha Biblioteca Católica.) 

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