Durante o tempo em que fui policial militar passei pelas mais diversas situações. Algumas engraçadas, outras tristes, algumas pitorescas. Certo dia, aconteceu uma digna de registro, que compartilho a seguir:
Brasileiro adora tecer comentários e fazer críticas sobre os mais variados assuntos - mesmo que não entenda nada a respeito. Temos o mal costume, também, de reclamar por serviços mal prestados a quem não tem nada a ver com a história.
Dentre as muitas situações vividas como servidor público selecionei uma digna de ser relembrada.
Estava eu e um colega trabalhando numa base comunitária da PM no bairro de Bela Vista 2, bairro este, disputado pelos municípios de Parnamirim e Macaíba. Éramos recém formados e sempre nos colocavam nos lugares onde os policiais veteranos não queriam ir.
A dita base comunitária era na verdade um depósito abandonado de um supermercado ao lado, cuja dona, querendo eleger-se vereadora e economizar com segurança privada, conseguiu policiamento para a área.
Não tinha nada na base: o patrulhamento era feito a pé, já que não havia viatura; o banheiro não funcionava; a água para higiene pessoal tinha que ser carregada de balde lá do mercadinho e a água para beber era conseguida de um vizinho homossexual que sempre dava em cima da gente.
A comida vinha de quentinha lá de Parnamirim. Uma viatura fazia a distribuição nas bases comunitárias e, como éramos os últimos do itinerário, a refeição sempre chegava fria e sem talheres.
Apesar das vicissitudes, levávamos o serviço a sério. A maioria das ocorrências que chegavam até nós eram resolvidas na conversa - que era tudo o que podíamos fazer. Mas um dia…
Uma senhora chega indignada lá na base. Reclamava que o país era uma bagunça, os políticos eram todos ladrões e que ninguém se importava com os pobres. O palavreado dela era tão forte que chamou a atenção dos que ali passavam.
Uma pequena aglomeração começou a se formar em torno daquela mulher. Aproximei-me da senhora e tentei acalmá-la; saber o que havia causado-lhe tamanha indignação. Mas ela não quis conversa, parecia estar gostando daquele espetáculo.
Foi então que uma conhecida da dita cuja chegou até mim e explicou que esta estava nervosa porque a filha doente não fora atendida num posto de saúde em Parnamirim por morar em Bela Vista - bairro pertencente a Macaíba.
Aproximei-me novamente da mulher e tentei consolá-la, mas antes que eu abrisse a boca ela gritou em alto e bom tom:
- E a culpa de tudo isso é da polícia, que não faz p@#* nenhuma!!!
Moral da história: naquele dia aprendi que:
I - o Estado estava falido, não proporcionava saúde, educação, infraestrutura, absolutamente nada! Só cobrava impostos;
II - os policiais, que eram honestos e levavam a sério o juramento, deveriam "se virar", caso quisessem prestar um serviço de qualidade à população;
III - as autoridades não se importavam com a polícia, a população não se importava com a polícia, a imprensa não se importava com a polícia, NINGUÉM se importava com a polícia;
IV - todos queriam que a polícia resolvesse seus problemas, mesmo que não tivesse nada a ver com as atribuições da polícia; e,
V - eu deveria sair da polícia...
(A imagem acima foi copiada do link Oficina de Ideias 54.)
Muito bom Paulino. Como sempre a culpa é da polícia. Como também é polícia que vende o seu voto por um litro de leite ou R$ 5,00.
ResponderExcluirParabéns, mais uma vez, pelo blog.
Abraço!
Por essa,eu queria ter visto...Ahahhahaha
ResponderExcluirEu me pareço com você, que quando estou em algum lugar,sinto que algo está prestes a acontecer...E...aconteceu...uma vez , presenciei um barraco daqueles..No final eu sai ironizando o ocorrido...
Ainda bem que você tomou a decisão correta: saiu da polícia...
ResponderExcluiranonymous
Repito o que eu disse
ResponderExcluirUma decisão sábia a que você tomou. Muitos potenciais humanos se perdem em profissões que em nada agrega valor a vida profissional e pessoal.
ResponderExcluirSe o Estado não fosse tão desorganizado, o crime não seria organizado.
ResponderExcluir;)
Chrys